O termo consumerismo foi criado para ser o oposto do consumismo (consumo desenfreado), portanto seria um modelo de consumo responsável, racional e com respeito ao meio ambiente em uma sociedade capitalista.
Quando eu era adolescente, nos meados da década de 80, lembro-me que minha mãe mandava-me comprar pão e manteiga na mercearia perto de casa, naquele tempo apelidada de “taberna”, em uma época que a concentração do varejo pelas grandes redes ainda não existia. Para ir às compras, levava uma sacola em tecido de algodão cru (reaproveitado de sacos de açúcar), costurada e bordada pela minha mãe, que fazia o acabamento das alças com argolas fixadas no tecido por pontos de crochê. Não havia sacolas plásticas, sendo que as famílias ou levavam sua sacola, ou tinham o pão embrulhado em folhas de papel e o pacote amarrado com barbante. Já a manteiga, vendida à granel, era embrulhada em folha de papel vegetal (ou papel manteiga). Quanto às demais mercadorias eram vendidas ou embrulhadas também em folha de papel ou em jornal, igualmente amarradas em barbante.
O lixo das residências era acomodado em latões e, no horário certo, era colocado na porta das casas para a coleta de lixo, pois, se posto antes, muito provavelmente seria “virado” pelos cães de rua (daí o porquê do sentido literal de “cachorro vira-lata”). Lembro-me que meu avô mandava colocar alças em tambores de óleo diesel para facilitar o serviço dos lixeiros, além de providenciar também uma tampa, criando mais essa demanda para os serralheiros.
O refrigerante, a cerveja, tudo era vendido em vasilhames retornáveis de vidro, ou seja, as famílias tinham sua reserva de garrafas para serem trocadas na compra da bebida, sendo a coleta dos vasilhames vazios realizada no momento da venda do produto pelo fabricante. Modernamente este conceito é definido como Logística Reversa.
Na escola, os livros didáticos, assim como o uniforme escolar (ou farda), eram herdados dos irmãos mais velhos. Eu mesmo cheguei a usar uma grossa camisa de algodão do Colégio Dom Bosco, de colarinho azul e emblema bordado, vinda de meu irmão, que por sinal era confeccionada para durar mais de um ano letivo. Não somente o uniforme, mas também era comum peças de roupa passarem por mais de uma geração.
Nos dias de hoje, cidades como Belo Horizonte (Lei Municipal 9.529/2008), Rio de Janeiro ( Lei Municipal nº 5.502/2009) e São Paulo (Lei paulistana 15.374/2001) criam leis abolindo as sacolas plásticas e o comércio varejista coteja embalagens vazias de papelão por sacolas plásticas, ou estimula os clientes a trazerem de casa suas sacolas, haja vista que a maioria das famílias usa a sacola descartável para acomodar o lixo doméstico, que vai parar nos aterros sanitários e lixões, levando de 50 a 500 anos para desaparecerem.
Essas leis são contestadas na justiça, principalmente pelos fabricantes de plástico e com apoio popular, ainda mais porque alguns supermercados passaram a cobrar pela sacola plástica, desagradando o consumidor.
Até mesmo os ambientalistas brasileiros desconfiam da eficácia dessa proibição, considerando que outras embalagens plásticas (principalmente as dos produtos industrializados) continuam no mercado e a indústria ainda não está preparada para substituir a forma de acondicionar seus produtos.
Vale salientar que na Alemanha há muito tempo que os consumidores pagam pelas sacolas de supermercado como forma de estimular os clientes a usarem uma solução assemelhada de minha mãe em áureos tempos. Tudo seria resolvido se, a exemplo da garrafa de refrigerante dos anos 80, a embalagem retornasse para a indústria para reaproveitamento, gerando a preocupação de fato com a logística reversa na cadeia produtiva. No entanto, isso implicaria em aumento nos custos das empresas e certamente essa conta seria paga pelo consumidor, embutida no preço dos produtos.
A bem da verdade, o consumismo é alimentado pelo obsoletismo acelerado ou, melhor dizendo, a vida útil dos bens é reduzida para que a indústria possa vender mais e mais e, paradoxalmente, isto seria bom para a economia e, por conseguinte, para toda a sociedade. Isto é que faz que os livros didáticos sejam substituídos a cada ano por uma nova edição, sepultando a antiga, ou mesmo justifica a troca de celulares, computadores, automóveis etc., por novos modelos que se tornam ícones de desejo.
A moda parece que passa mais depressa e os produtos são feitos para não durar tanto tempo assim. Por outro lado, nessa vida frenética, existe a corrente ambientalista clamando pela preservação do planeta, defendendo o retorno de um modo de vida que não considere tudo como descartável, pois está claro que não há como manter um padrão de consumo idêntico ao do norte-americano médio para todas as 7 bilhões de almas deste mundo. Não há recursos naturais suficientes para isto!
Assim, a sociedade cozinha em banho-maria, tal qual a síndrome do sapo na panela, na qual o pobre batráquio é colocado em água fria e lentamente a água é aquecida. Incapaz de perceber a mudança de temperatura, o animal morre escaldado. No entanto, se jogarmos o sapo diretamente na água quente, este pula para fora da panela, pois a mudança abrupta da temperatura desperta-lhe os sentidos.
A lógica apenas reforça que a humanidade, para os próximos 100 anos, continuará dividida entre os poucos muito ricos e os demais pobres, ou miseráveis.
O capitalismo não resolveu o problema da distribuição de renda no mundo, assim como o consumismo não é a via de desenvolvimento econômico e paz social. É evidente, pelo menos para mim, que a violência urbana tem um dos seus fatores críticos no alijamento dos jovens pobres dos bens de consumo que são valorizados na sociedade consumista. Os demais fatores são: a destruição da família; o sepultamento dos valores judaicos-cristãos pela judicialização dos comportamentos; e a falência do governo em promover serviços públicos de qualidade para todos (saúde, educação, segurança etc.).
Nos anos 80, época de minha lembranças de infância, a população brasileira era de 120 milhões, e éramos mais comedidos na maneira de consumir e agir com a natureza. Hoje, perto dos 200 milhões de habitantes, agimos como perdulários, ávidos pela última gota de satisfação, como se a próxima geração tivesse a obrigação de resolver todos estes problemas.
No entanto, colocamos nossa juventude em banho-maria, ao melhor estilo do sapo na panela e não a ensinamos como perceber a quentura.
Talvez ainda haja tempo para evoluirmos para o consumerismo, mas temos que tirar a juventude de dentro dessa panela.
João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont.
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