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sábado, 17 de setembro de 2022

A amnésia eleitoral


Estamos praticamente a duas semanas do primeiro turno da eleição que decidirá os representantes nas assembleias legislativas dos Estados e do Congresso Nacional e pouca, ou quase nenhuma, atenção dos meios de comunicação acerca da importância dessa escolha. A exposição da mídia concentra-se nas candidaturas de votos majoritários para governador e presidente da república, até mesmo não dando muita importância para a eleição de senadores que neste pleito serão escrutinados um por Estado e um no Distrito Federal. Essa total ausência de informação coloca nos ombros do eleitor o fardo de buscar conhecer, entre a miríade de nomes e siglas partidárias, um número que mereça ser digitado na urna eletrônica.

Segundo a sondagem da empresa de pesquisas Ideia Big Data, publicada pela Revista Exame de janeiro de 2018, 79% dos eleitores não se lembravam em quem votaram para o Congresso Nacional em 2014. Essa amnésia política despersonifica aqueles com mandato parlamentar dando a impressão que lá estão por imposição de uma força estranha alheia a democracia. Essa pretensa heteronomia política, estado este no qual o indivíduo crê que não tem autonomia na escolha de seus representantes, principalmente na eleição proporcional para deputados estaduais e federais, vem da repartição das cadeiras no parlamento pelo quociente eleitoral. Infelizmente em um país na 71o posição em matemática no PISA (sigla em inglês para Programa de Avaliação Internacional de Estudantes), prova internacional que avalia jovens de 15 anos e próximos ao final da educação obrigatória, demonstra a nossa fragilidade de raciocínio matemático.

O quociente eleitoral, para quem ainda não o conhece, convido a acessar o artigo 109 do Código Eleitoral, mas de forma sucinta é a quantidade de votos válidos dividida pelas cadeiras do parlamento que define quantos votos serão necessários para eleger um deputado. Por exemplo, o Amazonas tem oito cadeiras na Câmara Federal e possui 2,6 milhões de eleitores. Assim, caso não haja nenhum voto nulo ou em branco, um candidato para ser eleito por si só deve ter pelo menos 320 mil votos. Matematicamente, a exceção de Manaus, nenhum outro município amazonense tem quantidade de eleitores para eleger um deputado sem precisar contar com os votos somados pela legenda e coligação partidária. Parintins, o segundo colégio eleitoral do Amazonas, possui 72,9 mil eleitores, número insuficiente para que a Ilha de Tupinambarana tenha um representante somente seu. Ainda assim, mesmo em Manaus, conforme a Ata Geral de Resultados de 2018 publicada pela TRE-AM, o candidato mais votado foi Zé Ricardo – PT com 197.270 votos e não seria eleito sem o quociente proporcional. Considerando os 1.762.933 votos válidos em 2018, seriam necessários 220,3 mil votos para isso, mas somados com os votos dos outros candidatos da coligação (PT e PC do B) Zé Ricardo acumulou mais 24.646 e alcançou 237,6 mil, sendo o necessário para ser eleito. Nenhum candidato a deputado federal no Amazonas na eleição de 2018 foi eleito somente com os seus próprios votos.

A complexidade do voto proporcional afasta uma intimidade maior do candidato com o eleitor e os donos dos partidos sabem disso e não desejam mudar isso. Propostas como a do voto distrital que associa o candidato a uma determinada região é uma solução para democratizar ainda mais a escolha, principalmente no Amazonas que concentra mais de 50% dos eleitores na capital. A ignorância no modelo brasileiro de escolha de representantes fomenta a demonização da política, como se o Congresso Nacional fosse ocupado por uma súcia de ladrões, embora alguns tenha uma reputação que indique isso. O eleitor de maneira geral esquece em que votou e depois fica escandalizado com o orçamento secreto liberado por deputados que é desviado para corrupção.

A repugnância contra o parlamento pode continuar, ou ser extinta, a partir dos votos que serão digitados nas urnas em 2 de outubro próximo. Buscar conhecer bem o seu candidato, acompanhá-lo em seu mandato e saber com quem está coligado tende a melhorar nossa escolha. Assim sendo, o voto consciente pode estar literalmente na ponta de nossos dedos.

João Lago.