Fernando López sj (jflopezperez@gmail.com)
Arizete Miranda cns-csa (arizete78@yahoo.com.br)
Luis Valle (delgadov@gmail.com)
Com o grito “A luta continua... Unidos venceremos!!!”, iniciou-se na maloca de Maturuca (9-12/Abr/2012) o encontro dos tuxauas e lideranças da Região das Serras, Terra Indígena Raposa Serra do Sol (TIRSS) - RR. Um total de 62 lideranças discutiram
diferentes assuntos importantes para a vida dos povos da região: Projeto de Gado e
outros projetos de sustentabilidade; desafios, problemas e soluções das comunidades,
fortalecimento da organização, os pelotões militares na TIRSS, etc. Especial atenção
se deu à comunidade de Tamanduá, junto ao rio Cotingo, onde o governo quer fazer
uma hidroelétrica que ameaça a vida dos povos e da biodiversidade regional.
A história de luta da TIRSS é longa. Na assembleia de Surumu (1971) crio-se a
organização. Em Maturuca (Abr/1977) tomou-se a grande “Decisão: Ou vai ou racha”.
O Presidente Lula homologou a TIRSS (Decreto 534 de Abr/2005). E o Supremo
Tribunal Federal (Ago/2009) deu a sentença definitiva a favor dos indígenas e contra
os arrozeiros, fazendeiros que durante anos invadiram e violentaram suas terras.
Encontro de Tuxauas e Lideranças em Maturuca, Região das Serras, TIRSS (Abr/2012). Fotos: L. Delgado
No encontro foi mostrado o I Seminário Mundial contra a Hidroelétrica de Belo Monte
e os Grandes Projetos na bacia do rio Xingu (Altamira - PA, Out/2011) e a forte luta
dos povos da região contra as barragens. Eles denunciam o Governo da Presidenta
Dilma e seu Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que não respeita a vida
dos povos, das águas e das florestas da região, feridas de morte com as barragens.
Manifestações contra a hidroelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, Pará. Fotos: Arquivo CIMI2
Inspirados na luta dos parentes do Xingu e da própria história de luta, as lideranças
da Região das Serras posicionaram-se fortemente contra a proposta governamental da
hidroelétrica do Tamanduá: “Presidenta Dilma, escuta os povos indígenas: Nós não
queremos a hidroelétrica de Tamanduá!”.
Na visita a Tamanduá o tuxaua Hélio da Silva (37) explicou que hoje a comunidade tem
um total de 27 famílias com uma população de 178 pessoas; 1 escola de 1ª a 4ª série
com 32 alunos e 2 professores; 1 posto de saúde e 2 AIS; 1 igreja e 3 catequistas; 1
clube de mães com “corte e costura”. A comunidade conta com uma boa produção,
vários roçados familiares e comunitária, um total de 13 retiros com 652 cabeças de
gado, 93 cavalos, 47 carneiros, fora de outras criações de galinhas e picotes.
Centro da comunidade Tamanduá, junto ao rio Cotingo, Região das Serras, TIRSS. Fotos: F. López (2002) e L. Delgado (Abr/2012)
O tuxaua Hélio contou também a longa história de caminhada e luta da comunidade
contra os fazendeiros, garimpeiros e hidroelétrica do Tamanduá. Segundo ele a
comunidade é muito antiga, mas foi reconhecida oficialmente em 1995.
“Em tempos do tuxaua Constantino José Francisco (1989) iniciou a defesa da terra e
da cachoeira do Tamanduá. Os fazendeiros não deixavam caçar, pescar nem plantar
para conseguir o necessário para viver bem. Mandavam os capatazes destruir e
queimar as casas dos parentes com apoio dos soldados que estavam a seu serviço.
Além dos fazendeiros, os garimpeiros invadiam toda a região do rio Cotingo. E com
toda essa violência sofrida, os parentes não desistiram da luta e voltavam a construir suas casas e plantar suas roças.” Conta Hélio.
Segundo Hélio são várias as comunidades próximas que ficarão afetadas diretamente
pela hidroelétrica: Tamanduá, Tamanduá 2 (situada junto à cachoeira), Waromada,
Taboca, Caraparú III, Água-Fria, Cajú, Pedra Preta e outras. Além disso, será afetada
indiretamente toda a realidade socioambiental da região.
O tuxaua Hélio é firme na sua posição: “A comunidade de Tamanduá e as outras
comunidades da região são contra a construção da hidroelétrica do Tamanduá no rio 3
Cotingo. A barragem vai destruir a beleza de nosso rio e poluir suas águas, vai matar a vida dos peixes e dos animais que pescamos e caçamos, vai inundar nossas florestas e nossos campos onde fazemos nossos roçados e criações, vai alagar a terra onde
nascemos e onde estão enterrados nossos antepassados, vai nos afastar deste lugar e
com isso apagar a nossa própria história... Por que inundando a nossa mãe terra
afogará também a nossa própria vida.
Cachoeira do Tamanduá no rio Cotingo, Região das Serras, TIRSS. Fotos: Aldemir Macuxi e arquivo do CIR
Também foi denunciado que o Governo do Estado de Roraima fez propaganda
mentirosa fazendo um vídeo da região da cachoeira de Tamanduá sem mostrar as
comunidades, roçados, retiros, e criações que seriam afetadas pelo dito
empreendimento.
Um projeto muito interessante que a comunidade de Tamanduá está executando com o
apoio das comunidades da região é um “Centro de Produção” aproveitando a riqueza
dos recursos naturais da região. Com isto buscam ampliar e consolidar a ocupação da
área assegurando sua auto-sustentação.
Comunidade Tamanduá, área onde se está construindo o Centro de Produção, Região das Serras, TIRSS. Fotos: L. Delgado (Abr/2012)
Por último, é muito importante lembrar que no dia 20 de julho de 2011, o Deputado
LUIZ COUTO deu seu parecer como Relator do Projeto de Decreto Legislativo (PDC)
Nº 2.540/2006, sobre o aproveitamento dos recursos hídricos e dos potenciais 4
energéticos da Cachoeira do Tamanduá, no Rio Cotingo, na região das Serras da Terra
Indígena Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima:
“Por fim, o Projeto de Decreto Legislativo, por ter como objeto o aproveitamento de
recursos hídricos dentro de uma Terra Indígena, exige, conforme o entendimento da
AGU, a aprovação de Lei Ordinária que estabeleça as condições específicas de tal
atividade, conforme o § 1º do art. 176 da Constituição Federal, e que regule tanto a
autorização do Congresso Nacional como a oitiva prévia das comunidades indígenas
afetadas, conforme dispõe o § 3º do art. 231 da Constituição Federal. Até o momento
não existe nenhuma Lei vigente com tal teor.
Sendo assim, no que toca à constitucionalidade, o Projeto de Decreto Legislativo
apresenta-se prejudicado, ferindo os artigos 176, § 1º e 231, § 3º da Constituição
Federal, além de possivelmente incorrer em ilegalidade, por contrariar a Convenção nº
169 da OIT.
Por todo o exposto, opino pela inconstitucionalidade do Projeto de Decreto Legislativo
nº 2.540/2006.”
Com este parecer claro do relator, os povos indígenas da TIRSS esperam que a
Presidente Dilma escute realmente sua voz: “Nós não queremos a hidroelétrica de
Tamanduá”.
O encontro de tuxauas e lideranças da Região das Serras da TIRSS terminou com o
mesmo “grito de guerra” que começou: “A luta continua... Unidos venceremos!!!”