Há tempos o homem pergunta-se qual a vontade de Deus e para ilustrar esta reflexão lembrei-me do teto da capela sistina que retrata não somente, mas principalmente, os primeiros capítulos do livro de Gênesis. Pintada por Michelangelo, o centro do afresco mostra a criação do homem, na qual Adão e o Criador parecem com os seus braços e mãos estendidos, mas não se tocam. Uma versão da intenção de Michelangelo é a de deixar Adão separado de Deus pela flexão do dedo indicador, ou seja, bastaria o primeiro homem esticar o dedo para tocá-lo. Esse gesto é uma interpretação do livre arbítrio, pois a reconciliação do homem com o seu criador estaria tão somente limitada a vontade humana de alcançá-lo. No entanto, é certo que a doutrina cristã coloca a corrupção humana pelo pecado como empecilho para essa reconciliação, mas foi vontade de Deus, por amor a sua criação, enviar Cristo para redenção dos nossos pecados. Cristo veio ao mundo e a seu tempo não foi muito bem compreendido em suas palavas de amor e redenção, tanto que foi necessário morrer na cruz pelos pecados dos homens.
Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara Federal, muito antes da Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI que acontece no senado, já recebeu sessenta e oito pedidos de impeachment, sendo que somente seis pedidos foram analisados por Lira que restaram arquivados ou desconsiderados. Em minha análise, quando a CPI instalou-se a sua intenção era produzir a “mãe de todos os pedidos de impeachment” a partir da ação supostamente criminosa de Bolsonaro agir para deixar o coronavírus espalhar-se e contaminar mais rapidamente um maior número de pessoas para enfim alcançar a famigerada “imunidade de rebanho”, na qual o vírus deixaria de circular e o contágio e as mortes cessariam. Seria a base desse pedido de impeachment a interpretação do descaso de Bolsonaro para a compra de vacinas, sua insistência em querer empurrar cloroquina como um remédio que previne a doença e o seu comportamento pessoal de não usar máscaras, de promover aglomerações e de desqualificar as medidas adotadas pelos governadores e prefeitos para frear o contágio do vírus, como fechamento temporário de comércio e serviços não essenciais. Entretanto, com o depoimento dos irmãos Miranda na CPI na última sexta-feira (25/6), ficou claro pelas falas de alguns senadores e senadoras que os trabalhos agora têm uma nova frente mais robusta de investigação: o golpe bilionário da compra de vacinas da covaxin que estava sendo ministrado nas veias do Ministério da Saúde.
O livre arbítrio e a vontade de Deus, inicialmente expostas, ganham correlação com três fatos. Primeiro a insistência que Bolsonaro declara que: “somente Deus me tira dessa cadeira presidencial”. Segundo as manifestações ocorridas que levaram milhares de pessoas às ruas pelo impeachment de Bolsonaro e que pressionam o Congresso Nacional a partir do aumento da adesão da população ao “fora Bolsonaro”. Por último, está nas mãos de Arthur Lira, que tem o poder constitucional para tal, aceitar qualquer um dos pedidos que estão engavetados ou aguardar que a CPI produza um material explosivo que possa incendiar ainda mais as ruas, assim como se não bastassem os 500 mil mortos e a ameça real que Bolsonaro é para a saúde pública e para a democracia no Brasil. A “Aliança pelo Brasil” de Bolsonaro com o Centrão de Arthur Lira e Ricardo Barros, ambos do Partido Progressistas (PP), fez que em 20 de maio último o presidente desse a seguinte declaração: “Fui do PP por muito tempo. Ele (senador Ciro Nogueira atual presidente do PP) não está apaixonado por mim, mas está me namorando, quer que eu retorne ao PP. Quem sabe, se ele souber conversar, for bom de papo, quem sabe a gente volte. Não estou me fazendo de difícil, é um grande partido”. Bolsonaro assim se manifestou porque precisa de uma legenda para concorrer em 2022 e o caminho mais cômodo seria abraçar-se de vez com Lira, Nogueira e Barros. Parece que essa “trindade” (que não é santa) está ameaçada pelas forças sinistras que induzem os homens a corrupção dos pecados.
O deputado Luís Miranda (DEM-DF), com o apoio de seu irmão, colocou Bolsonaro nu e as evidências demonstram que será necessário “construir uma narrativa” (termo na ponta da língua dos bolsonaristas quando o assunto é a CPI) para lá fantástica que possa esclarecer todas as convergências que puseram Bolsonaro despido no colo do PP em um namoro não muito inocente para os padrões conservadores. A última coincidência aconteceu em 6 de maio quando Bolsonaro nomeou a mulher de Barros para uma cadeira no conselho de administração da Itaipu Binacional, com um salário de R$ 27 mil, para comparecer em reunião que acontece a cada dois meses. É importante que se diga que quando Bolsonaro nomeou Cida Borghetti e anunciou namoro com o PP, ele já tinha sido avisado em 20 de março, pelos irmão Miranda, da irregularidade criminosa da importação das vacinas da covaxin, portanto não somente deixou de levar adiante a investigação para a Polícia Federal, conforme prometera, bem como resolver premiar a Barros e sua mulher. Para provar tudo isso, o delator Luís Miranda insinuou que existe uma gravação da conversa que tiveram com Bolsonaro e o ameça para que não ouse desmenti-lo. Se provado que foi avisado e nada fez, independente das vacinas terem sido compradas ou não, Bolsonaro cometeu o crime de prevaricação e corrupção passiva, artigos 319 e 317 respectivamente do código penal que, por ironia, somados dão pena máxima de 13 (treze) anos. Os mais leigos poderiam perguntar: mas qual seria a vantagem recebida por Bolsonaro? Simples, manter o apoio do PP, principal partido do Centrão, não desagradando Lira que tem a chave da gaveta dos pedidos de impeachment e arrastar-se como presidente até o final de 2022 e preparar o golpe anunciado contra as urnas eletrônicas e a falácia do “voto impresso e auditável”. Bolsonaro insisti em ignorar que em vinte e cinco anos não houve nenhum registro de fraude no processo eleitoral brasileiro e que ele mesmo vem sendo eleito a sucessivos mandatos pela mesma urna que hoje desacredita.
O ditado popular diz que “Deus escreve certo por linhas tortas” e esse Deus que Bolsonaro tanto cita parece querer demonstrar qual seja a sua vontade, porque outro ditado diz: “o povo é a voz de Deus”, neste caso a voz de Deus reverbera nas bocas de uma multidão está indo para as ruas protestar. No entanto, é uma incógnita se Arthur Lira tenha se arrependido dos engavetamentos dos pedidos de impeachment, pedido penitência de seus pecados e esticado o dedo para alcançar Deus. Não existe citação bíblica que possa encaixar-se mais nos acontecimentos que: “e conhecerão a verdade, e a verdade libertará vocês” (João 8:32). Que a CPI traga toda e verdade que precisamos para nos libertar de Bolsonaro.
João Lago
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