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segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Porque é Natal o mundo não acabou


Durante toda a semana eu estive a brincar sobre os presságios do fim do mundo, que deveria ter ocorrido nessa última sexta-feira, e pacientemente li e vi na TV várias explicações alentadoras de astrônomos e historiadores que seria impossível haver uma catástrofe mundial sem que soubéssemos disto com alguns anos de antecedência, pelo menos naquilo que afirma o pragmatismo científico. Assim, por enquanto, o fim do mundo está previsto pela ciência para daqui a um bilhão de anos, quando o nosso sol começar a esgotar o seu combustível nuclear, ou quando por acidente algum cometa entrar em rota de colisão com a terra. No mais, todas as demais teorias ficam para que Hollywood, com seus efeitos especiais, fature milhões de dólares explorando o tema.

O final do mundo que se anunciou trouxe desesperança a muitas pessoas ao redor do mundo, levando a mesma angústia que acomete à alguém que sabe, por meio de uma sentença de morte, que tem os seus dias de vida determinados. No entanto, tenho alguns exemplos de pessoas que fizeram do anúncio da morte uma oportunidade de vingar-se dela, primeiro por juntar forças para lutar pela vida e, depois, quando desenganadas, levar esperança àqueles que eventualmente chorariam sua ausência. Essa proximidade com o inevitável os fizeram pessoas espiritualizadas, sejam elas cristãs ou não.

Frei Leonardo Boff
Dos ateus célebres, Oscar Niemeyer com o avançar da idade em sua biografia diz que “gostaria de acreditar em Deus”. Neste mesmo sentido, Darcy Ribeiro quando soube que o seu câncer era inoperável mandou chamar Frei Leonardo Boff e Frei Beto, porque queria ardentemente respostas sobre a existência de Deus. Conta Leonardo Boff que quando foi recebido por Darcy Ribeiro, ele declarou: "Boff, quero ter uma conversa metafísica. Quero abordar a questão da morte, o que vem depois da morte, e não tem nenhum interlocutor, entre os meus amigos, que possa sustentar o discurso que eu quero". Os amigos materialistas não poderiam consolá-lo, assim precisaria de alguém espiritualizado, pois ainda restava-lhe a lembrança da mãe que morreu cheia de fé e tranquila e diz: “eu invejo você (Boff), que é um homem inteligente e de fé. Eu não tenho fé. Como gostaria que fosse verdade". Porém, é bem verdade que também tenho exemplos de pessoas que enfrentaram um câncer, apegando-se firmemente na fé por causa da doença, mas quando curadas voltaram a sua mesquinhez e a viver por elas mesmas. Por enquanto todos nós teremos o nosso fim de mundo, não como comorientes, mas em nosso fim de mundo individual.
Darcy Ribeiro

Durante muito tempo eu dizia que chegávamos ao fim solitários, haja vista que por anos me perseguia a imagem da morte ilustrada pela música “Uma Ilha” (Une Île), que é cantada por Nana Mouskouri, no refrão que diz: “Ce serait là face à la mer immense / Là pour venger mes vengeances / Toute seule avec mes souvenirs / Plus seule qu'au moment de mourir”. Em minha livre tradução fica assim: “Isto será ali defronte ao mar imenso / Muito só com as minhas lembranças / ali para vingar minhas vinganças / Completamente sozinho, como no instante de minha morte”. A música toda é melancólica e retrata a desesperança esboçada na face da morte como o fim de tudo. A visão de estar completamente sozinho na hora da morte não era compatível com minha busca por respostas metafísicas, até que um amigo uma vez me disse: “você não está sozinho, porque o sacramento da comunhão, que é o Deus vivo, é acolhido no teu corpo, assim você nunca estará sozinho”. Desta forma, acredito que tenha encontrado a resposta que precisava e toda vez que recebo a comunhão, em minha oração particular digo sempre: “meu Senhor e meu Deus” (Jo 20, 27) e peço a Ele que aumente a minha fé.

O mundo da forma que nós conhecemos ainda persiste, assim como a esperança em nossos corações ainda vigora, por saber que nem tudo está resumido naquilo que é material aos sentidos humanos. Não sou um ser materialista, mas também estou muito distante de ser exemplo de fé, talvez jamais me transforme em um. Sou um profundo sabedor de quem sou e busco ser uma pessoa melhor, como se cada dia de minha existência fosse o último e a mim fosse necessário estar preparado para uma partida imediata. Assim, se vou a qualquer momento não preciso carregar-me de muitas coisas, sendo suficiente para mim minha dignidade, minhas lembranças e o amor a Deus. A vida é uma chama tênue, exposta as intempéries do mundo e dos homens. Não odeio a morte assim como não maldigo a vida.

Neste final de ano não há símbolo maior de esperança que a lembrança do nascimento de Cristo, pois agora sabemos, por meio dele, que a vida não se resume somente neste mundo.

Feliz Natal, feliz ano novo.

João Lago
Administrador e professor.

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