Eu não gostaria de
escrever sobre isto, pois nesta semana os jornais nos massacraram
exaustivamente com essa declaração do ministro da justiça de
Dilma, José Eduardo Cardozo, quando disse que preferia morrer a
cumprir pena nas prisões brasileiras. Isto é uma verdade, as
péssimas condições do sistema carcerário brasileiro, que nada
devem as masmorras descritas por Alexandre Dumas no início do Século
XIX. Muito se fala em direitos humanos e o papel ressocializador que
o cárcere deve cumprir a um apenado, mas cadeia foi feita para pobre
e quando, por acaso, um rico é encarcerado não é feito sem
aprovação unânime da opinião pública, pois em geral é pela
prática de crime de atentado contra a vida (por exemplo: Suzane von
Richthofen, o casal Nardonni, Elize Matsunaga). Faltava, neste
contexto, enviar para cadeia banqueiros e políticos pelo crime de
colarinho branco e outras personalidades que costumeiramente
frequentavam as colunas sociais.
José Cardozo sabe que
não existe “cadeia para rico”, pois cadeia é cadeia ruim em
todo o Brasil. No entanto, lembrei-me de Pablo Escobar, bilionário
traficante colombiano e dublê de político (chegou a ser eleito
parlamentar) que só foi para a cadeia depois que mandou fazer uma
especialmente para ele, onde escolheu o local da construção e até
fez a seleção dos carcereiros, isto tudo para não ser extraditado
para uma prisão nos EUA (bem melhores que as brasileiras). O
presídio era um primor e bem diferente daqueles existentes na
Colômbia. Na verdade, tudo era uma farsa, um pano de fundo para
diminuir a pressão estadunidense sobre a Colômbia no combate ao
tráfico internacional de drogas, já que naquela época 80% da
cocaína produzida na Colômbia tinha destino certo o território
norte americano. Pablo Escobar queria sair de cena, mas para voltar
depois, então não poderia ficar recluso em qualquer cadeia.
A realidade de José
Dirceu, e dos demais condenados a mais de oito anos, é que devem
passar uma temporada em regime fechado, amargando alguns anos como
inquilinos do péssimo sistema carcerário brasileiro, a menos o
governo comece a preocupar-se em construir também cadeia para rico.
Sim, porque sabemos que existem alternativas para quem tem dinheiro
para outras necessidades e que passam bem longe do que é
“disponibilizado” para o brasileiro ordinário. Assim, se sentem
um dor de barriga, vão faceiramente para o Sírio Libanês, ou Copa
D'or, a depender do bolso, ao invés de buscarem o SUS – Sistema
Único de Saúde. Quando suas filhas e mulheres vão parir, o fazem
nas melhores maternidades e hospitais e não sabem o que é uma
mulher batendo as portas das maternidades e hospitais a procura de
vaga de internação. Nessa última quinta-feira mesmo (15/11), no
Distrito Federal, uma mulher deu a luz dentro de uma viatura
policial, minutos depois de ter sido recusada em uma maternidade da
periferia de Brasília. Aqui em Manaus não é diferente e posso
dizer que sou testemunha ocular disto, no trabalho de acompanhamento
que fiz com mulheres atendidas pela ONG que até este mês fui
administrador.
Quando os filhos tem
que ir a escola, os enviam para as melhores colégios do Brasil, ou
no exterior e jamais pensariam em matriculá-los em qualquer escola
pública de ensino fundamental e médio. Enquanto isso, produzimos em
nossas escolas indivíduos que crescem como analfabetos funcionais,
pois sabem ler e escrever, mas não sabem interpretar nem compreender
o que leem. Não é por acaso que a universidade pública é um
celeiro de filhos de ricos, nascidos na classe média para cima e nas
faculdades particulares, em sua maioria, os filhos da escola pública.
Roberto Gurgel - Procurador Geral |
Embora tudo que eu
escrevo aqui são coisas mais que evidentes, ou seja, que os serviços
públicos um dia só serão de bons quando forem feitos para todos,
não somente para pobres, ainda assim o discurso do ministro José
Cardozo é carregado de significado, justamente para que este
julgamento do mensalão não seja algo excepcional, ou de
conveniência política como afirmam algumas vozes do governo Dilma e
PT. Sinceramente acho que sim, corre este risco, pois somos nós
testemunhas ocular da história de nossa jovem democracia, e bem me
lembro de Geraldo Brindeiro, chamado de “Engavetador Geral da
República”, no mesmo papel executado pelo sósia de Jó Soares (o
procurador Roberto Gurgel) que engavetou 242 inquéritos criminais
que recebeu, arquivou outros 217 dos 626 que recebeu. Somente 60
denúncias foram aceitas por ele. As denúncias pesavam sobre 33
senadores, 194 deputados, 11 ministros e quatro sobre o próprio
presidente FHC, no que se refere a compra de votos para sua
reeleição. Talvez se este processo contra FHC tivesse sido aceito,
não haveria Marcos Valério e os demais operadores do mensalão,
pois sabemos que desde aquela época que deputados trocavam votos por
dinheiro. A certeza da impunidade é que fez chegarmos ao nível de
corrupção que temos hoje em nossa sociedade.
A questão que precisa
ser respondida é se teremos continuidade em todas essas
investigações, desmantelando e mandado para cadeia também os
outros envolvidos em outros mensalões, como o do PSDB em Minas, do
DEM no Distrito Federal, e todos os outros caixas dois que são
rotineiramente evidenciados nos jornais.
Seria péssimo para
democracia brasileira se este julgamento entrar para história não
como o início da punição exemplar dos crimes de colarinho branco,
mas como um julgamento de conveniência política que se encerra
aqui. Seria triste constatar que o julgamento do mensalão veio do
desejo particular de umas poucas cabeças e não da inspiração do
desejo de mudanças da esmagadora maioria do brasileiros.
João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont
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