A música “Mourrir demain”, da cantora pop francesa Natasha St-Pier, pergunta o que faríamos hoje se soubéssemos que iríamos morrer amanhã. Não entendo muito de filosofia e não li o suficiente para construir um raciocínio filosófico baseado em grandes pensadores. Não sei o que escreveu sobre a morte Santo Agostinho, que foi um filósofo da fé cat
ólica, ao mesmo tempo que desconheço o que tenha escrito Jean Paul Sartre, que, oposto a Agostinho, era filósofo ateu e materialista. Assim, face a minha completa ignorância, vou descrever aqui o que penso a respeito do que é o fim inevitável de cada um de nós: a morte física.
O poeta argentino Jorge Luis Borges, que era ateu convicto, disse que na “verdade é que morremos a cada dia e nascemos a cada dia”, mas sobre uma visão ainda mais pessimista que esta, em um entrevista que Borges concedeu ao poeta amazonense Thiago de Mello, o mesmo disse que potencialmente nascemos mortos. Não gostaria de passar a impressão que sou completamente pessimista sobre o tema, tanto que para isto o iniciei com a ilustração de uma música alegre e dançante, pois, de maneira geral, não vivemos angustiados com a perspectiva da morte, apesar dela estar potencialmente presente em nossa existência. Porém, quando conheço ou tomo conhecimento de pessoas que em algum momento de suas vidas tiveram que conviver com a aproximação da morte, até mesmo o mais ferrenho ateu torna-se um ser espiritualizado, em busca de respostas. Já aqueles que não descartaram a metafísica em sua perspectiva de vida, mesmo que afastados da religião, quando sabem que a morte ronda, apegam-se a Deus na mesma proporção que se distanciam Dele quando curados. Voltam as suas vidas de rotinas habituais.
O livro “Claro como o dia” é uma obra interessante, escrita pelo então presidente da KPMG, uma das maiores empresas de consultorias do mundo, por descrever os preparativos de quem sabe que em breve vai morrer, ao ser diagnosticado com um câncer inoperável no cérebro. A partir disto, o executivo Eugene O´Kelly, da KPMG, começa a planejar o pouco tempo que resta em sua vida para aproveitá-la ao máximo e deixar algum legado. Escrever um livro sobre os seus preparativos para morte estava dentro deste conceito. Justamente neste ponto é que convirjo ao dizer que nossa angústia não é saber que a morte nos ronda, mas não ter a certeza do dia e hora em que a mesma irá chegar e não estarmos preparados para aceitá-la.
Quem assistiu ao filme “Abril Despedaçado”, de Walter Salles, estrelado por Rodrigo Santoro, deve lembrar que o protagonista, ao ser jurado de morte, recebe como sugestão de seu algoz em contar os seus dias vindouros como “menos um”. É interessante esta metáfora, pois, normalmente, as pessoas quando acordam pela manhã suspiram: “Mais um dia”. Essa é a perspectiva de quem não sabe quanto tempo lhe resta, enquanto que “menos um” seria o suspiro correto de quem sabe que o seu fim está próximo.
Particularmente, acho que encontrei uma resposta que cabe em mim, no que se refere a aceitar o final de minha existência como inevitável, ao tentar refletir sobre o que mais me angustia. Cheguei à conclusão que a maneira mais humana ou, melhor dizendo, dentro do racionalismo humano, seria que tivéssemos cada um de nós a noção exata de quanto tempo nos resta de vida neste mundo. No entanto, isto não é possível, pelo menos para mim, que não tenho qualquer inclinação a pôr fim em minha própria existência e tão pouco fui diagnosticado como possuidor de uma doença terminal.
Não obstante, busco estar em dia com a minha espiritualidade e a pratico, sem exageros, em meu dia a dia, pois acredito que se faz uma leitura errada das falas dos profetas quando dizem que o fim está próximo, pois não se referem ao fim da humanidade, mas ao fim específico do homem, quando a morte faz que o tempo deixe de ter qualquer significado racional.
Se um dia é certo que o Ressuscitado irá voltar, quando morremos nos aproximamos inexoravelmente do dia de encontrá-lo. Então, devemos estar preparados para isto, em paz com nossa consciência e com o mundo. Assim, se vivemos dando significado real a nossa existência na construção de um legado para quem fica com o sentimento do dever cumprido, não temos porque temer a chegada da morte.
Finalizo relembrando o apóstolo Paulo, quando diz: “Lutei o bom combate, completei a corrida, guardei a fé”. Que façamos de nossa existência uma luta necessária que nos aproxime da fé e assim não temeremos absolutamente nada, nem mesmo a morte.
João Lago
Administrador, professor e morador do Conj. Santos Dumont.
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