Neste início de ano estive em uma invasão no Tarumã, que é um bairro de
Manaus que ainda possui grande área de mata natural, por isto tão sujeita ao
que se chama por “indústria das invasões”. O local que visitei é inóspito, insalubre, desumano e o esgoto corre a céu
aberto e as instalações de energia elétrica e água potável são precárias. Fui
nessa invasão para visitar um amigo que conheci há cinco anos, em uma época que
apesar de pobre, vivia em condições melhores com sua mulher, um filho e uma
enteada. Moravam de aluguel em uma casa de madeira, mas resolveu apostar que
ocupando um lote em uma invasão logo ganharia uma casa do governo.
Esse amigo tinha perspectiva de melhoria de vida, principalmente quando
voltou a estudar e formou-se em geografia, talvez por minha insistência em
dizer-lhe que a fórmula da ascensão social do pobre ainda passa pelo estudo
(Joaquim Barbosa que o diga), muito embora exista uma forte corrente que prega
que o sucesso pode ocorrer por acaso, em estar no local certo, na hora exata e
ter a uma aptidão específica, ou muita cara-de-pau. Assim, esse amigo quando
ficou desempregado e sem condições de pagar o aluguel, achou que a melhor saída
seria, seguindo outros tantos acostumados a esta esperteza, invadir um terreno alheio e crendo que era
provisório, mas já faz quase dois anos que está morando em um barraco com
paredes de lona. Achou que bastava querer, estar em evidência e contar com a
sorte. Talvez consiga, mesmo que amargue mais algum tempo, pois promessa de
regularização por políticos “espertos” em época de eleição não faltaram.
Nessa corrente de ser esperto e querer se dar bem em pouco tempo é que
se enquadram políticos de ocasião, Geyse Aruda, os BBBs, meninas fantásticas,
marias chuteiras e, mais recentemente, aqueles que postam vídeos na internet em
alguma situação que faça rir, mesmo que seja uma piada de gosto duvidoso. Optar
por uma fórmula de sucesso rápido é mais aceitável do que alguns longos anos de
trabalho árduo e estudo. No entanto, o afã de uma conquista rápida dos desejos
materiais que são ícones de sucesso, principalmente em uma sociedade que
idolatra o consumo, podem levar aos desvios morais e éticos reprováveis, como
agir fora da lei, viver da prostituição, descambar para a corrupção etc.
Apesar de óbvio que a pressa possa motivar atitudes pouco louváveis ou
irresponsáveis, parece ser verdade que o imediatismo está completamente
enraizado, agindo como uma erva daninha pronta a infestar mesmo um bom coração.
É justamente nesta corda bamba que se equilibra o ético/moral e o
ético/relativismo. O que é ético/moral não precisa de apresentações, pois a
ética deriva da moral vigente, que por sua vez baliza-se na cultura que cria os
paradigmas de uma sociedade. Já o ético/relativismo é uma aberração porque
deriva de uma ética torta, ou melhor dizendo, não tem base na moral coletiva e
busca, conforme a situação, encontrar mecanismos que justifiquem o
injustificável. É exemplo disto, o pastor que faz uma oração sobre um dinheiro
que ele sabe vem de corrupção; o aluno que faz um plágio de um trabalho, ou
prepara ciosamente uma cola, parecendo desconhecer que isto se trata de uma
fraude não muito diferente daquela que compra um diploma, haja vista que o
resultado é o mesmo, ou seja, um curso superior fraudado; a propina para o
guarda de trânsito e toda sorte “pequenos delitos” escusáveis, pois toda a
esperteza não seria castigada.
O mais irônico nisto tudo é que iniciei esta resenha relatando a
desaventura de um alguém que se submete a viver em condições subumanas para
conseguir uma casa no grito. No entanto, em uma distribuição de casas do
programa “Minha Casa Minha Vida”, na Zona Norte de Manaus, conheço quem tenha
colocado sua casa a venda, mesmo antes de recebê-la. Não é que não precise do
imóvel, pois mora de favor com a família na casa de parentes, mas não vê nada
de mais negociá-lo, porque é longe, distante do trabalho e da escola dos
filhos. Espera com o dinheiro conseguir comprar algo mais próximo de onde
atualmente mora. Que mal há nisto?
O mal é o relativismo que entorpece a ética e, nisto tudo, chego a
conclusão que a esperteza parece ser um atributo mais bem distribuído no
Brasil, com uma maioria a exercê-la por conveniência, pois aquele que não a usa
corre o risco de ser chamado de tolo.
João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont
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