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terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O mundo é dos espertos


Neste início de ano estive em uma invasão no Tarumã, que é um bairro de Manaus que ainda possui grande área de mata natural, por isto tão sujeita ao que se chama por “indústria das invasões”. O local que visitei é inóspito,  insalubre, desumano e o esgoto corre a céu aberto e as instalações de energia elétrica e água potável são precárias. Fui nessa invasão para visitar um amigo que conheci há cinco anos, em uma época que apesar de pobre, vivia em condições melhores com sua mulher, um filho e uma enteada. Moravam de aluguel em uma casa de madeira, mas resolveu apostar que ocupando um lote em uma invasão logo ganharia uma casa do governo.

Esse amigo tinha perspectiva de melhoria de vida, principalmente quando voltou a estudar e formou-se em geografia, talvez por minha insistência em dizer-lhe que a fórmula da ascensão social do pobre ainda passa pelo estudo (Joaquim Barbosa que o diga), muito embora exista uma forte corrente que prega que o sucesso pode ocorrer por acaso, em estar no local certo, na hora exata e ter a uma aptidão específica, ou muita cara-de-pau. Assim, esse amigo quando ficou desempregado e sem condições de pagar o aluguel, achou que a melhor saída seria, seguindo outros tantos acostumados a esta esperteza,  invadir um terreno alheio e crendo que era provisório, mas já faz quase dois anos que está morando em um barraco com paredes de lona. Achou que bastava querer, estar em evidência e contar com a sorte. Talvez consiga, mesmo que amargue mais algum tempo, pois promessa de regularização por políticos “espertos” em época de eleição não faltaram.

Nessa corrente de ser esperto e querer se dar bem em pouco tempo é que se enquadram políticos de ocasião, Geyse Aruda, os BBBs, meninas fantásticas, marias chuteiras e, mais recentemente, aqueles que postam vídeos na internet em alguma situação que faça rir, mesmo que seja uma piada de gosto duvidoso. Optar por uma fórmula de sucesso rápido é mais aceitável do que alguns longos anos de trabalho árduo e estudo. No entanto, o afã de uma conquista rápida dos desejos materiais que são ícones de sucesso, principalmente em uma sociedade que idolatra o consumo, podem levar aos desvios morais e éticos reprováveis, como agir fora da lei, viver da prostituição, descambar para a corrupção etc.

Apesar de óbvio que a pressa possa motivar atitudes pouco louváveis ou irresponsáveis, parece ser verdade que o imediatismo está completamente enraizado, agindo como uma erva daninha pronta a infestar mesmo um bom coração. É justamente nesta corda bamba que se equilibra o ético/moral e o ético/relativismo. O que é ético/moral não precisa de apresentações, pois a ética deriva da moral vigente, que por sua vez baliza-se na cultura que cria os paradigmas de uma sociedade. Já o ético/relativismo é uma aberração porque deriva de uma ética torta, ou melhor dizendo, não tem base na moral coletiva e busca, conforme a situação, encontrar mecanismos que justifiquem o injustificável. É exemplo disto, o pastor que faz uma oração sobre um dinheiro que ele sabe vem de corrupção; o aluno que faz um plágio de um trabalho, ou prepara ciosamente uma cola, parecendo desconhecer que isto se trata de uma fraude não muito diferente daquela que compra um diploma, haja vista que o resultado é o mesmo, ou seja, um curso superior fraudado; a propina para o guarda de trânsito e toda sorte “pequenos delitos” escusáveis, pois toda a esperteza não seria castigada.

O mais irônico nisto tudo é que iniciei esta resenha relatando a desaventura de um alguém que se submete a viver em condições subumanas para conseguir uma casa no grito. No entanto, em uma distribuição de casas do programa “Minha Casa Minha Vida”, na Zona Norte de Manaus, conheço quem tenha colocado sua casa a venda, mesmo antes de recebê-la. Não é que não precise do imóvel, pois mora de favor com a família na casa de parentes, mas não vê nada de mais negociá-lo, porque é longe, distante do trabalho e da escola dos filhos. Espera com o dinheiro conseguir comprar algo mais próximo de onde atualmente mora. Que mal há nisto?

O mal é o relativismo que entorpece a ética e, nisto tudo, chego a conclusão que a esperteza parece ser um atributo mais bem distribuído no Brasil, com uma maioria a exercê-la por conveniência, pois aquele que não a usa corre o risco de ser chamado de tolo.

João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont

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