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terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Louvores dentro da igreja ou obras sociais?

Quando o cardeal Jorge Mario Bergoglio aceitou ser o novo papa da Igreja Católica, logo a imprensa brasileira alardeou que se tratava de um argentino. Posso dizer que na minha pouca fé, abalada pelos brios que reside na rivalidade futebolística, perguntei-me: Por que um argentino e não um brasileiro? Afinal somos a maior nação católica do mundo.

Quando a imprensa publicou que se tratava de um jesuíta pessoalmente fiquei confortado e confiante, baseado na minha experiência de haver trabalhado com jesuítas durante três anos e, nessa convivência, tenho orgulho de dizer-me amigo de vários religiosos da congregação fundada por Santo Inácio de Loyola no Século XVI. Posso testemunhar que são homens (não há mulheres em vida consagrada na Companhia de Jesus) que passam por uma formação esmerada e em diversas áreas, sendo comum encontrar advogados, contabilistas, físicos, sociólogos entre seus pares, além do ensino comum a todos em filosofia e teologia quando sacerdotes. Vários entre eles são poliglotas pela vivência em estudo acadêmico e serviço religioso em diversos países. Assim, decididamente eu poderia esperar que um cardeal jesuíta eleito papa tivesse uma mensagem diferente dos seus demais antecessores.

As mensagens que chegam do papa Francisco chegam aos católicos de forma oficial por meio das encíclicas publicadas pela igreja, ou pelas entrevistas que são publicadas nos meios de comunicação. Li com especial atenção a Encíclica Lumen Fidei (A Luz da Fé), escrita em conjunto pelos papas Francisco e Bento XVI, principalmente no trecho em que diz: “a discussão sobre a salvação pela fé ou pelas obras da lei. Aquilo que São Paulo rejeita é a atitude de quem se quer justificar a si mesmo diante de Deus através das próprias obras; esta pessoa, mesmo quando obedece aos mandamentos, mesmo quando realiza obras boas, coloca-se a si própria no centro e não reconhece que a origem do bem é Deus. Quem atua assim, quem quer ser fonte da sua própria justiça, depressa a vê exaurir-se e descobre que não pode sequer aguentar-se na fidelidade à lei; fecha-se, isolando-se do Senhor e dos outros, e, por isso, a sua vida torna-se vã, as suas obras estéreis, como árvore longe da água”. Foi por isso que quando Francisco esteve no Brasil declarou que a Igreja Católica não poderia ser uma ONG, tão pouco poderiam os católicos ficar reservados aos louvores dentro dos muros da Igreja. Em uma linguagem mais direta e popular, Francisco mandou os bispos católicos “cheirar as ovelhas”.

Em uma reportagem da Revista Época, Dom Júlio Endi Akamine conta que foi jocosamente interpelado por um bêbado em uma favela de São Paulo que disse: “Aí, hein? Obedecendo ao papa! Veio cheirar as ovelhas!”, fazendo uma referência a Evangelii Gaudium (Alegria do Evangelho), na qual Francisco diz preferir uma igreja quebrada, esfarrapada e suja, por atuar nas ruas, a uma Igreja enferma, por estar confinada e se agarrar a uma ilusória sensação de segurança. Dom Alkamine respondeu ao bêbado: “O papa não pediu para cheirar as ovelhas. Mais que isso, pediu para ter cheiro de ovelhas de tanto andar no meio do rebanho”.

Há quem dissesse que Francisco é marxista por suas ideias sobre o que é justiça social dentro das veias atuais do capitalismo, em uma economia que mata, ou que permite que muitos morram pela miséria. No entanto, quem diz que isto é marxismo não percebe o passado, ou não reconhece o papel da Igreja nos primórdios do capitalismo, quando o papa Leão XIII na Encíclica Rerum Novarum em 1891 (Das Coisas Novas) critica fortemente o capitalismo emergente que escravizava e explorava homens, mulheres e crianças nas fábricas da Europa. Naquele tempo, em um mundo em transição, inicia-se a Doutrina Social da Igreja Católica, que não é marxista, mas puramente cristã.

Desta forma, muitos esperam uma grande revolução na igreja católica, por meio de Francisco, restrita ao casamento de padres, de divorciados e de homossexuais na igreja, ou a clericalização de mulheres. Acredito que uma igreja viva e secular sobrevive na fé e em sua capacidade de enfrentar os grandes debates de seu tempo, buscando ser empática com o sofrimento particular de cada um, pois essa capacidade de sentir a dor do próximo está na raiz da identidade cristã. Porém, mais urgente e revolucionário que essas questões circunscritas a grupos sociais específicos, está em fazer que a Igreja de louvores carismáticos saia porta afora combatendo as injustiças sociais, levando conforto aos pobres, doentes, drogados e demais párias da sociedade.

Como leigo, em minhas observações, digo que isto não é uma tarefa fácil, pois muitos se encontram encastelados em zonas de conforto e agarrados na ilusória sensação de segurança descrita por Francisco. No entanto, agora podemos dizer que os olhares da Igreja Católica com o papa estejam mais atentos para a promoção de uma fé que tenha reflexo não tão somente em uma fé expressa em louvores a Deus, mas também em obras sociais, pois juntas, obra e fé, engrandecem e louvam ao Senhor.
 João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont

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