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quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Setembro Negro

Há muito tempo que percebo um fenômeno silencioso que se entranha em todos os movimentos sociais e políticos no Brasil, ou dando o nome aos bois, o completo esvaziamento de pessoas de bem em todas as causas que deveriam ser presididas por gente por conduta moral ilibada. Cada vez mais os finórios corruptos se entranham e ganham corpo na sociedade e nada temem, porque acabam por ter respaldo de seus pares distribuídos nas esferas de poder.

O caso do deputado presidiário é um exemplo, pois aqui se quebra um paradigma. Pensava-se que o STF – Superior Tribunal Federal fosse a estância limite para a condenação penal e moral na lenta justiça brasileira, na qual o advogado bom não é aquele que absolve o seu cliente, mas aquele que consegue postergar ao máximo a condenação, levando-a até o limite de prescrição da pena. Esses advogados que são os considerados bons, os mais prestigiados, os mais caros e concorridos. No entanto, não quero dizer que a culpa seja dos advogados, pois bem ou mal usam do que o sistema judiciário permite e que está na legislação brasileira. Portanto, se utilizam desses meandros protelatórios o fazem cumprindo o compromisso de garantir ampla defesa de seus clientes. Assim, a mudança deveria ser obtida pelo legislativo, pela mudança da lei no Código de Processo Penal, mas considerando um plenário que livra um bandido da perda de mandato (aqui não cabe mais o eufemismo de “suposto bandido”, pois a última estância da justiça o condenou), como esperar que se mude uma legislação que colocaria a Espada de Dâmocles(1) sobre a cabeça de cada membro do Congresso Nacional? Tenho a completa convicção que a maioria do Congresso Nacional deseja que nada se mude na lei de processo penal.

As altas instâncias de poder já abrigam gente que acredita estar acima de qualquer censura, acumulando desatinos que ferem qualquer bom senso pueril. Por exemplo, o ministro Joaquim Barbosa, último bastião de justiça consagrado pela imprensa brasileira, em um arroubo de novo rico, resolve comprar um apartamento em Miami. Até aqui tudo bem, pois não desejo discutir o ideal de cidade que Barbosa escolheu para ter um imóvel, mas a forma como o fez. No Brasil qualquer funcionário público é proibido de ter empresa, pois a lei brasileira não permite. No entanto, para comprar imóvel nos EUA Joaquim Barbosa abre uma empresa de fachada e compra o apartamento em nome dessa para obter benefícios fiscais. Assim, Barbosa inaugurou o seu jeitinho brasileiro em terras do Tio Sam. Há quem pense que isto tudo é só uma esperteza, mas diminui Barbosa a altura de Lewandowski, ou pior ainda, ao nível de Dias Toffoli, que não se acha impedido de relatar o processo do Banco Mercantil do Brasil(2), instituição a qual esse ministro obteve 1,4 milhão em operações de crédito, a juros muito abaixo do padrão de mercado, para serem quitadas em 17 anos. Como tudo está orquestrado entre os amigos, a Advocacia Geral da União – AGU, que deveria zelar pelos interesses do erário, acha normal um juiz receber empréstimos de quem deva julgar interesses milionários. Cumpre lembrar que Dias Toffoli foi advogado do PT e ocupou diversos cargos no governo Lula, sendo este é o único atributo em sua biografia pífia, comparada com a de seus pares, que poderiam lhe conferir comenda de ser indicado para a mais alta corte do país.

O escárnio pela ética já não mais escandaliza, pois se “os idiotas perderam a modéstia”, muito antes os ladinos da república perderam o medo de estabelecer seus balcões de negócio a luz do dia, ou a distribuir seus pares em todas as esferas de poder debaixo de nossas narinas. A última foi a indicação por Dilma Rousseff de Zé Carlinhos para embaixador em Angola, um sujeito condenado em primeira instância por sua participação na Máfia dos Sanguessugas(3). Não obstante, o mesmo ainda deverá ser aprovado pelos senadores, mas o que esperar de uma turma que está sem moral frente a opinião pública e que é presidida por Renan Calheiros? Certamente Zé Carlinhos será aprovado com louvor pelos nobres senadores. O governo angolano que se cuide e coloque suas barbas de molho.

Tudo isto que escrevi acima revela como nas altas esferas se destaca o comportamento ignóbil como um padrão a ser seguido, afastando aqueles que eventualmente possam ter algum ideal de justiça e amor ao bem comum. Quem em sã consciência estaria predisposto a chafundar-se na lama e ser confundido com os porcos? Se desejas ser rotulado de bandido, expresse vontade de filiar-se a um partido político e a concorrer a um cargo eletivo. No entanto, em Junho deste ano brotou em nossos corações a esperança que a nação havia despertado e, contrariando os apelos sensatos da mãe de meus filhos, temerosa com a violência de um grupo de alienados e de marginais, incentivei nossas crianças a saírem comigo às ruas pedindo um Brasil ético e socialmente justo. Bem a propósito, quando já estávamos voltando para casa, recebo a ligação de um sobrinho, que seguiu mais adiante na caminhada, preocupado em saber onde estávamos, pois havia iniciado um quebra-quebra e a polícia estava reprimindo duramente todos os que estavam ao redor: os inocentes e os culpados.

Neste mês setembro acompanhei, na imprensa e nos portais da internet, as convocações que estavam sendo feitas para que se repetisse no dia da pátria uma nova onda de protestos por todo o Brasil como aquelas ocorridas no mês de Junho. Sinceramente duvidei que tal fato voltasse a se repetir, como ainda duvido que se reproduza a permanecer a ocupação das ruas por esses bandidos oportunistas que estão roubando do cidadão indignado o legítimo direito de manifestar-se nas ruas com os seus filhos e família de maneira pacífica. Assim, se nas altas esferas os ladinos se encastelaram, nas ruas quem manda é o néscio mascarado, esses beócios travestidos de manifestantes que cumprem o papel de ajudar os bandidos que estão no poder, pois ao reduzirem tudo a depredações e a roubos, afasta a população ordeira e honesta das ruas, reduzindo a pressão pública sobre a roubalheira nas altas esferas da república.

Infelizmente iniciamos um Setembro Negro, pois se esvai, em meio as nuvens de gás lacrimogênio, chuvas de spray de pimenta, saraivada de balas de borracha e estrondo de bombas de efeito moral, toda a esperança em uma primavera cívica brasileira.

João Lago.
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont.

Notas:
  1. Conta a mitologia que Dâmocles quis saber como seria ser rei, vivendo de ser bajulado e desfrutando da boa vida que um governante possui em seu palácio. Um rei tirano chamado Dionísio propôs que Dâmocles experimentasse ser governante e o convidou a sentar-se no trono de rei por um dia. Porém, ao chegar ao palácio e sentar-se no trono, viu um espada pontiaguda pendurada por uma tênue linha apontada para sua cabeça. A espada simboliza que o governante deve temer o ônus pesado que o poder traz consigo.
  2. O Banco Mercantil do Brasil entrou com recursos contra o INSS pedindo compensações por contribuições previdenciárias que teriam impacto favorável em toda sua folha de pagamento e contra a Receita Federal para redução da alíquota do Confins de 4% para 3%, cabendo a Dias Toffoli avaliar e relatar o mérito do pedido.
  3. Máfia dos Sanguessugas, ou máfia das ambulâncias, foi um escândalo de corrupção acontecido em 2006 com a descoberta de uma quadrilha que desviava dinheiro público destinado à compra de ambulâncias, na qual o ex-deputado federal José Carlos Fonseca Júnior (Zé Carlinhos) foi condenado em primeira instância por peculato e por ferir a lei das licitações.

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