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domingo, 12 de setembro de 2021

A viagem em busca do amor

Amor, quatro letras cujo significado já foi tão explorado por poetas, filósofos, religiosos, psicanalistas, porém essa expressão do sentimento humano ainda parece tão carente de explicação. Poderia começar a destrinchar o amor pelo significado platônico, daquele que somente ama o que verdadeiramente não possui. O amor invejoso que deseja ardentemente o que não é seu, mas, da mesma forma que anseia, o abandona tão rapidamente ao possui-lo. O amor efêmero da paixão fugaz que evapora como água ao sol escaldante do egoísmo. No entanto, amar dessa maneira não explicaria corretamente aquele amor duradouro e desinteressado.

O filósofo Aristóteles, ao contrário de Platão, não tratou explicitamente o significado do amor, mas abordou a felicidade humana como um processo do equilíbrio entre o abundante e o escasso. Desta forma, o amor momentâneo de Platão daria lugar a uma atitude racional em colocar significado ao que deseja a fim de alcançar a felicidade, pois o ser humano em desequilíbrio no que ambiciona jamais encontrará a felicidade. No entanto, alguém poderia dizer que essa tentativa de racionalizar os desejos levaria a um amor repleto de hipocrisia. Talvez, a frustração de quem possa imaginar que a busca do equilíbrio esteja errada, porque jamais em sua vida fez uma reflexão profunda do que deseja para si na máxima socrática: “conhece a ti mesmo” no que vou tentar exemplificar com uma experiência pessoal.

Aos dezoito anos sai de Manaus muito cheio de sonhos em realizações pessoais e fui para Boa Vista – Roraima. Era a minha primeira experiência em sustentar-me como o meu trabalho e sem qualquer ajuda de terceiros. Coisas simples como pagar o aluguel, as contas da casa, alimentar-me e, sempre que possível, gozar algum lazer. Os bens materiais logicamente permeiam os desejos de sucesso e que mais queria é ter um automóvel, mas não poderia ser qualquer carro. Teria que ser aquele considerado o melhor em sua categoria e um dia expressei esse desejo a um amigo já em situação financeira bem melhor que a minha. Contudo, no lugar de concordar comigo, disse-me que o seu sonho era possuir um mais básico da categoria e via brilho em seus olhos. Duvidei e perguntei, com tantas opções melhores de veículo, qual o sentido em escolher o mais básico e sem muitos opcionais, ao que me respondeu: “porque esse eu vou conseguir comprar”. Nessa época, ainda pouco conhecia da vida e o meu interesse pela filosofia era uma tábua rasa, mas imediatamente percebi que a felicidade está em valorizar o acessível a partir da racionalização de nossas expectativas. Saber quem eu sou, do que sou capaz e buscar a felicidade a partir das minhas escolhas, mesmo que não sejam aquelas que os outros possam valorizar.

O amor aristotélico é norteado pelas virtudes nas quais não se ama o inalcançável, mas a quem (ou aquilo) que nos possa trazer felicidade. Assim, nas relações afetivas também o amor passa por um processo racional na qual a estética seja o menos importante e neste caso acredito que algumas mulheres acertam ao definir (melhor do que os homens) o objeto de seus desejos. Algumas nomeiam como o homem ideal alguém que seja divertido, honesto, trabalhador, fiel e muito superficialmente abordam aspectos físicos, É bem verdade que jamais estarei presente em uma reunião só de mulheres para ter certeza que são essas as qualidades desejadas, mas são as que algumas socialmente expressam. No entanto, em reuniões masculinas o que menos interessa são as virtudes de uma mulher quando o assunto é desejo. O correto no sentido do amor aristotélico seria o homem amar não a beleza de uma mulher, mas suas virtudes porque essas não se esvaem com o tempo. A bem da verdade, toda a beleza é efêmera (feminina ou masculina) é isso já está no senso comum.


Não poderia finalizar este breve ensaio sobre o amor sem abordar Paulo de Tarso em I Coríntios 13, que corresponde ao amor Ágape. Talvez, para diferenciá-lo de um sentimento mundano, a versão católica do texto sagrado tenha substituído amor por caridade. Ainda assim, não tira a beleza que o apóstolo Paulo confere ao amor pregado por Cristo que faz da verdadeira felicidade aquela capaz de fazer bem ao outro. Amar desta maneira, como Jesus amou, vai além da ética de Aristóteles, Sócrates e Platão baseada no hedonismo ou nas virtudes, pois o amor verdadeiro em Cristo é desinteressado do sujeito passivo da ação de amar. Para ser mais claro, não se espera nada em troca daquele que se ama. Infelizmente o amor Ágape parece uma ficção, mas são as utopias que nos apontam como os conflitos humanos nos distanciam do ideal, neste caso do amor verdeiro.

O amor é como a bagagem de um viajante que não cabe muita coisa, portanto a depender do objetivo da jornada às vezes leva-se somente o necessário para bem aproveitá-la. Se for para diversão levamos na mala uma boa quantidade de desejos hedônicos não tão compromissados com as virtudes. No entanto, se o objetivo da viagem for a busca de uma felicidade duradoura, o que mais pesará na bagagem serão as virtudes e o desejo de fazer feliz ao outro. Assim, antes de escolher um companheiro para uma viagem pergunte o que ele está carregando em sua mala, pois a depender da resposta talvez se evite uma grande frustração.

João Lago

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