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domingo, 11 de julho de 2021

Jogo sujo e mentiroso

Um jogo de azar que contém certa razoabilidade é o pôquer, mas não no sentido do completo domínio da partida e da certeza da vitória. Quem somente conhece esse jogo de cartas pela encenação de filmes sabe que faz parte do jogo o “blefe”, ou seja, fazer crer aos adversários que o conjunto de cartas que se tem nas mãos é superior aos demais. Aquele que dobra a aposta pode levar o que está sobre a mesa sem a necessidade de mostrar suas cartas, desde que nenhum outro pague para ver. Esse tipo de atitude mexe com a fragilidade do outro, pois como o adversário não conhece as cartas do oponente, pode ser que até tenha um bom jogo nas mãos, mas por não acreditar que tenha cartas suficientes para vencer, não dobra a aposta e, ou, não paga para ver. A bem da verdade, o pôquer é um jogo de azar no qual aqueles que sabem mentir, fingir e dissimular podem sair vencedores. Daí o porquê que geralmente os jogadores de pôquer são retratados no cinema como sujeitos de baixíssima moral.



O cenário político das últimas semanas bem que poderia retratar uma mesa de pôquer, pois fatos não faltam para ilustrar. Por exemplo, os irmãos Miranda fizeram calar Bolsonaro porque insinuaram, na Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI (no Senado Federal), que talvez tivessem nas mãos a gravação na qual denunciaram ao presidente Bolsonaro a compra superfaturada de vacinas da covaxin pelo Ministério da Saúde. É certo que Bolsonaro, segundo os Miranda, além de apontar o responsável pela fraude, nada fez e prevaricou pela omissão, ou melhor dizendo, estaria supostamente deixando o roubo acontecer. A imprensa, nem a CPI, tão pouco Bolsonaro não sabem se a gravação realmente existe, mas Bolsonaro não é capaz de pagar para ver e dizer que não houve a denúncia e prefere ficar calado. Face ao silêncio, um bom jogador de pôquer poderá supor que os Miranda, por terem dobrado a aposta ao ameaçar que não ouse Bolsonaro desmenti-los, tem nas mãos um “royal straight flush” (maior combinação possível do jogo).


Em uma outra mesa, Bolsonaro joga cartas com a sociedade brasileira tendo como parceiros de jogo alguns militares que integram o seu governo. O presidente jamais demonstrou em sua biografia apreço pela democracia e respeito pelas instituições que a sustenta. Sua conduta errática, principalmente no combate a pandemia e as denúncias de corrupção, foi-lhe descapitalizando e restam muito poucas fichas sobre a mesa. Bolsonaro vendo sua popularidade derreter, olha para ao lado e busca em seus correligionários de partida uma última cartada: o blefe. Diz que as urnas eletrônicas são fraudadas, essas mesmas que ao longo de vinte anos elegeram a si próprio e aos seus filhos, falando abertamente que não haverá eleição se não for adotado o voto impresso. A arrogância de Bolsonaro reside no apoio que supostamente tem das forças armadas que estariam dispostas a apoiá-lo em uma aventura golpista. É verdade que os generais, almirantes e brigadeiros da ativa em tese não podem se manifestar politicamente, mas uma linha tênue foi transposta quando o general Pazuello não foi punido por participar de “motociata” com Bolsonaro no Rio de Janeiro. Seguindo na garupa de Pazuello, recentemente comandantes do exército, marinha e aeronáutica assinaram uma nota conjunta de repúdio ao senador Omar Aziz (PSD-AM) por ter o parlamentar mencionado a existência de “uma banda podre” nas forças armadas que apoiam Bolsonaro e que estão envolvidas nos casos de corrupção da compra de vacinas. O sensato seria jamais militares da ativa serem chamados para participar de qualquer governo além do limite constitucional imposto as forças armadas. Como Bolsonaro demonstra que fará qualquer coisa para manter-se no poder, não tem nenhum pudor em oferecer vantagens pecuniárias aos militares em seu governo, como por exemplo a Portaria 4.975/21, do Ministério da Economia, que autorizou militares acumularem salários acima do teto constitucional. Esse mesmo impulso de sobrevivência política que também fez Bolsonaro distribuir bilhões em emendas ao Centrão e calar-se quando soube que um deles estava envolvido nas acusações dos irmãos Miranda.


A sociedade brasileira observa atônita e já não aguenta mais as loucuras de Bolsonaro e isto está demonstrado nas recentes pesquisas. O presidente buscou criar todo esse mal estar porque é de sua essência o confronto e não tem escrúpulos em demonstrar o que é: um sujeito de pouca inteligência emocional, baixa moral e nenhum respeito pela verdade. Talvez ele não saiba nem que cartas tem nas mãos, mas mesmo assim blefa e espera que o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal pague para ver. A nós brasileiros restam colocar nossas fichas na mesa e abastecer as instituições democráticas com manifestações populares mais numerosas e decididas a não tolerar mais ameças. Estamos no limite e é necessário darmos um basta nesse jogo sujo e mentiroso.


João Lago.

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