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quarta-feira, 4 de junho de 2014

Compro um par de óculos ou uma geladeira?



Manaus, 29.4.2013

Em 2002, quando morava em Belo Horizonte, a assembleia legislativa mineira criou
a CPI do leite, tentando descobrir o que encarecia tanto o leite UHT (leite longa vida ou de caixa), haja vista que o produtor rural recebia apenas R$ 0,22, enquanto que na gondola do supermercado o preço era de R$ 1,50, ou seja, do produtor até o consumidor havia um acréscimo de quase 600%. Acompanhei todo esse problema de perto, pois na época trabalhava para uma multinacional que produzia leite longa vida.

Leite é um elemento básico da alimentação, portanto não se trata de artigo de luxo, então mais do que necessário o esclarecimento público no que se refere a indícios de cartelização do setor. Alimentação e saúde encabeçam as necessidades básicas de qualquer indivíduo, portanto mais do que justo  o esclarecimento de como se formam preços, principalmente quando surgem algumas dúvidas sobre eventuais abusos por parte de setores do comércio e da indústria para com a economia popular. Neste caso, quero me referir aqui diretamente ao comércio de armações e lentes de óculos em lojas especializadas.

Abro o jornal e dele retiro um encarte que oferece uma geladeira ao preço de R$ 869,00, basicamente o preço que é oferecido por um par de óculos em qualquer uma dessas redes de óticas de Manaus. No mesmo encarte, encontro um celular de marca famosa, que aceita dois chips pelo preço de R$ 229,00, que sinceramente quase não se encontra um par de óculos que seja razoável neste valor. O mais interessante é quando entramos em uma loja dessas, eles facilitam o pagamento em parcelas a perder de vista, querendo passar a impressão que é uma pechincha. Tem até uma ótica no centro da cidade que montou um bar dentro da loja, que serve bebidas variadas (uísque, refrigerante, vinho etc.) para oferecer ao cliente. Até pode ser uma boa estratégia, entorpecer a mente do pobre coitado para que ele não perceba o quanto que é absurdo o preço praticado em um artigo que não é de luxo, mas de necessidade.

Se você usa óculos e pagou mais de R$ 700,00 por uma “boa armação” (perdoe-me o trocadilho), pense em uma geladeira, ou mesmo em um celular e perceba quanta tecnologia está agregada ao produto. Quanto material utilizado, ou mesmo o quão é extensa a cadeia produtiva para que o mesmo seja oferecido ao preço que é encontrado na loja. Ora, uma geladeira pesa e é volumosa, portanto dever ter uma logística que agregue um custo de armazenamento, movimentação e transporte da fábrica até as lojas, o mesmo pode se dizer dos celulares, mas um par de óculos, que peso tem? Que espaço ocupa?

Em maio de 2011 as polícias do Paraná e de Minas Gerais desmantelaram uma quadrilha que contrabandeavam armações chinesas pagando centavos de dólar e, após os produtos serem “esquentados”, eram vendidos no comércio de Curitiba e Belo Horizonte a preço semelhantes aos praticados aqui em Manaus. Nesse esquema, que envolvia várias empresas de fachada, foi preso inclusive um ex-deputado federal por Minas Gerais, Francisco Sales Dias Horta, além de grandes empresários donos de redes de óticas nos dois estados.

Logicamente que um esquema fraudulento que compra por centavos e vende a preço de ouro, quando “esquentado” por notas ficais de entradas falsas, gera uma dinheirama que precisa ser justificada, ou melhor dizendo, esse dinheiro todo tem que ser “lavado”. Se alguém viesse me perguntar qual a melhor maneira de “lavar dinheiro”, eu provavelmente poderia sugerir algum tipo de comércio, provavelmente ligado a serviços, como por exemplo: Produzir Show e Eventos, cuja receita é gerada em bilheteria. Ora, tanta gente compra ingressos de show e não vai, não é mesmo? Ou ainda, quem pode aferir se realmente determinado show ou evento gerou tal quantidade de receita que diz que arrecadou? Não tenho experiência no ramo, mas acho que talvez o ECAD, quando a negociação sobre os direitos autorias implique o envio de fiscais no dia do evento, caso contrário, acredito que não.

Não por acaso, vejo óticas patrocinado (ou será produzindo?), tantos shows aqui em Manaus, que me deixa com meus nervos a flor da pele, pois o meu par de óculos está bem velhinho, já descascando a armação, precisando eu de óculos novos, mas parece que a minha miopia é menor do que aquela que acomete o meu povo que não enxerga que há algo de errado no preço de lentes e armações que são oferecidos em nossa cidade.

Situação pior é quando se vai a uma dessas óticas acompanhados de filhos adolescentes, pois neste caso meu amigo, face a exigência estética que eles nos impõem, acho que R$ 700,00 vai parecer uma verdadeira bagatela. Provavelmente vais pagar em uma armação e lentes o preço de uma TV de  LED – Full HD de 32 polegadas no mínimo.

João Lago.
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont

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