Nesta semana o ator recém formando
em psicologia Vinícius Mourão, atualmente trabalhando como vendedor em uma loja
de shopping center da zona norte do Rio de Janeiro, deixou a prisão após passar
16 dias encarcerado sob acusação de assaltar a bolsa de uma copeira.
Vinícius fez uma participação na
novela "Lado a Lado", mas não tem sua fotografia registrada no quadro
de elenco da novela no sítio da Rede Globo na internet. É bem provável, pelas
fotos divulgadas de sua participação, que tenha feito um papel menor, como
aquele que se abre para homens e mulheres negras nas novelas de época da TV Globo,
geralmente representando a escravidão. Também é comum que negros, mulatos e
pardos tenham papéis assegurados como domésticos de famílias brancas e ricas. Assim,
não se pode dizer que seja uma constante a oferta de bons papéis para atores
negros e a distribuição do elenco da Globo acaba também por repetir o que
acontece na sociedade brasileira, na qual uma minoria branca ocupa o
protagonismo.
A discriminação racial de negros,
mulatos e pardos, não parece ganhar guarida no ativismo por direitos civis da
Globo, tanto o quanto atualmente a emissora tem defendido em suas novelas o “ativismo
gay”, quando invariavelmente há uma personagem homossexual de destaque no
folhetim, ou se formam casais do mesmo sexo que trocam juras de amor eterno.
Antes que me chamem de
homofóbico, devo esclarecer que defendo a união estável de pessoas do mesmo
sexo para fins previdenciários e de herança, mas refuto a utilização do termo
casamento, pelo princípio etimológico da palavra referir-se a união de um homem
e uma mulher em um compromisso civil e religioso que assume a possibilidade da
gerar filhos. Também repilo qualquer preconceito e ódio para com qualquer
pessoa, por sua aparência física, cor da pele ou por sua ideologia moral e
comportamental. Na verdade, as ideologias e comportamentos devem ser debatidos
no campo das ideias, do que representam e as suas consequências boas, ou más,
para a sociedade.
O ativismo gay da Rede Globo tem
a sua razão de existir e se sobrepõe as questões raciais por estar relacionado
com a estética definida no “padrão Globo de qualidade”. O preto, o gordo, o
deficiente físico (de fato) não tem papel constante e de destaque nas novelas por
ser considerado esteticamente prejudicado, ou no linguajar popular, representam
o feio. Quando há distribuição de papéis, ficam restritos as participações e
pontas em personagens menores, como escravos em novelas de época e serviçais.
A partir deste exemplo, sustento
que é um absurdo a equiparação dos direitos civis garantidos aos negros igualmente
para o ativismo gay, ou mesmo absurda é a comparação que gays sofrem na
sociedade idêntica discriminação que sofrem os negros, mulatos e pardos. Já
escrevi sobre isto, mas repito que são vários os colegas professores universitários
gays, mas são poucos aqueles professores de pele negra. O mesmo acontece em
outras profissões, como médicos, advogados, juízes, jornalistas, atores e
diretores de televisão. São muitas as profissões de destaque que o fato de ser
gay não é motivo para a não ascensão profissional e financeira, mas o mesmo não
se reflete na sociedade quando o indivíduo é negro. Voltando ao caso da Rede
Globo, vários são os atores, produtores, diretores, apresentadores que são homossexuais,
mas quantos são aqueles em idêntica posição de destaque que sejam negros? Não
vou cometer a indelicadeza de citá-los, mas posso garantir que são muitos os
gays e que não se equiparam a quantidade de negros. Assim, seria plausível a
distribuição de cotas para atores gays nas novelas? Ou igualmente distribuição
de cotas nas universidades públicas e empregos públicos para indivíduos que se
declarem gays?
Na verdade suponho que toda a
ênfase que a rede Globo dá ao ativismo gay não se trata da defesa de direitos
civis, mas apenas reflete a influência do lobby que grupos internos gays de
destaque fazem para que a sociedade, principalmente os jovens, tenha
condescendência com o assédio de homossexuais. Qualquer tipo de assédio não
consentido é repugnante, mesmo aquele direcionado de um homem para uma mulher,
como aquelas cantadas de cunho sexual que as mulheres sofrem nas ruas, na
escola e no trabalho. No entanto, ao criminalizar a conduta moral que possa
reprovar o assédio de um homossexual a qualquer pessoa, chamando isto de
homofobia, o ativismo gay busca, por meio da judicialização dos costumes, impor
que o assédio gay seja protegido por lei e isento de reprovação.
Vejam o que está acontecendo nos
EUA, naqueles estados que aprovaram o casamento gay. Alguns profissionais como fotógrafos,
confeiteiros, floristas e demais envolvidos na prestação de serviços em
casamentos, estão buscando na justiça o direito de negar sua participação em
casamentos gays, alegando necessário respeito a sua convicção religiosa. É como
se fosse um habeas corpus preventivo para que não sejam obrigados a participar
de casamentos que atentem contra suas convicções morais e tenham respaldo contra
ações futuras de indenizações milionárias como aquelas que ouvimos falar que
existem nos EUA. Isto está acontecendo em um país que não possui uma legislação
específica que criminalize a discriminação étnica (racial), como a que existe
na legislação brasileira, mas que tem tradição na defesa dos direitos de minorias
e do direito a liberdade de expressão (inclui-se credo religioso).
Reafirmo que devemos rechaçar
qualquer tipo de discriminação e não ignorar que existem grupos hipossuficientes
na lei que precisam de proteção da sociedade, porque faltam vozes que possam
levantar-se ao seu favor. Em se tratando do ator, psicólogo e vendedor, mesmo
com todas as evidências apontarem sua inocência, ainda assim passou 16 dias
preso por ser preto e remediado (não vou chamá-lo de pobre) e ainda vai
responder em liberdade até que um juiz determine sua culpa ou não. Se fosse
qualquer outro negro, que não tenha tido uma participação na novela da Globo,
certamente teria que amargar mais dias na prisão, porque seria considerado mais
um preto ladrão previamente condenado por sua aparência e cor de pele.
Neste caso, seria da mais
profunda ironia para esta minha reflexão se o juiz que venha a declarar Vinícius
Mourão definitivamente inocente fosse alguém que se identificasse como
homossexual, mas certamente o sucesso profissional do magistrado não seria
destacado em noticiário como incomum. E é justamente nisto que consiste toda a
diferença.
João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont.