sábado, 4 de fevereiro de 2012
Opinião: A superficial vitrine social
Uma experiência pessoal motivou-me a escrever esta reflexão e o desejo de compartilhá-la contigo. Nessa última sexta-feira (27/1) foi o meu aniversário e recebi inúmeros votos de felicitações dentro de meu perfil no facebook, alguns deles de colegas de trabalho da faculdade.
Dou aulas à noite e na sexta-feira não tinha os dois primeiros tempos, portanto cheguei na sala dos professores por volta das 20h10min., mas como o período letivo ainda não começou, estavam todos os professores ali reunidos de forma descontraída, ou absorvidos em alguma ocupação momentânea. Muitos dos que enviaram parabéns pelo facebook estavam naquela sala, os quais cumprimentei, mas nenhum parecia lembrar que há poucas horas atrás tinha-me enviado uma mensagem cordial de parabéns. O meu aniversário parecia esquecido no mundo real até quando o professor Polesel entrou na sala e foi-me cumprimentar desejando-me parabéns, seguindo pelos outros professores, inclusive daqueles que já haviam enviado felicitações pela rede social na internet. O mais engraçado nesta história é que o Prof. Polesel ficou sabendo de meu aniversário por meio da lista de aniversariantes fixada no mural da coordenação, um meio de comunicação limitado e não considerado de massa.
As redes sociais ganharam importância no movimento social quando as manifestações que ocorreram no Oriente Médio, chamadas pela imprensa como primavera árabe, repercutiram na utilização das mídias sócias,tais como facebook, orkut e twitter como peças fundamentais na articulação e comunicação que possibilitou as reuniões e passeatas de protestos. Há aqueles que advogam a ideia que sem essas mídias sociais não seria possível a organização das manifestações que derrubaram governos na Tunísia, Egito e a guerra civil que derrubou o ditador Muammar Gaddafi. No entanto, essa reflexão que faço, apesar de não ter validade como uma pesquisa comportamental válida, certamente é um indício que a manifestação de sentimentos e opiniões nas nas redes sociais não necessariamente acarretam ação, ou manifestação social efetiva, havendo talvez uma desvinculação entre o desejo de ações no mundo virtual que parece não repercutir no mundo real. Aos colegas pesquisadores, novamente reitero que não se trata de pesquisa válida, mas quem sabe um norte para uma boa pesquisa que venha a ser realizada dentro das metodologias científicas aceitas.
No ano passado efetivamente comecei a acessar com mais frequência o facebook, apesar de possuir registro de perfil desde 2008, quando ainda era pouco conhecido pelos brasileiros, mais acostumados com o orkut. Este perfil foi feito em um estágio que fiz na Colômbia somente no intuito de ver e baixar as fotos postadas pela Fundación Amar y Servir, a partir das visitas que fiz as cidades de Bogotá, Bucaramanga, Buga e Cali (noticia completa em:http://www.cpalsj.org/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?from_info_index=46&infoid=3314&sid=172&tpl=printerview). Na Colômbia, na companhia de meu amigo jesuíta Jorge Eduardo Serrano, pude ver na prática como as mídias sociais podem apoiar a divulgação de ações sociais e arregimentar pessoas que se identificam com determinada causa ou sentimento. Neste sentido, desde 2010 eu administro conteúdo para o Blog da Amipaz(http://amipaz-manaus.blogspot.com)e iniciei em 2011 a postar notícias em meu perfil no facebook, além de associar o que é publicado nessas mídias com o microblog twitter. Recentemente eu passei a administrar conteúdo para o Blog da Associação Viva a Vida (http://vivaavida-associacao.blogspot.com) e também para outros perfis criados no facebook, sempre associados a ações reais desenvolvidas na sociedade.
Minha experiência demonstra que as redes sociais são ferramentas eficientes por reunir informações para serem difundidas entre amigos e até desconhecidos, mas ainda não estou convencido que possam motivar ideias e manifestações de massa fora da rede virtual, como aquelas que se viram no Oriente Médio. É bem verdade que frequentemente a imprensa noticia que gangues de jovens (como aqueles pertencentes a torcidas organizadas) se articulam pela internet para realizar ataques a grupos rivais ou praticarem atos de vandalismo. Ao pegarmos estes exemplos, podemos intuir que somente o desejo visceral (neste caso oriundo do ódio) pode ser um dos motivos capaz de motivar o indivíduo à ação. Este mesmo desejo visceral que motivou as manifestações da população árabe contra as ditaduras.
Já aqui no Brasil, algumas manifestações contra a corrupção, que hoje pode ser apontada como a principal chaga brasileira, apesar de terem obtido bastante repercussão nas redes sociais, não se transformaram proporcionalmente em ações reais. Acompanhei várias tentativas de reunião, todas fracassadas por reunir um número ridículo de participantes. Este fato pode ser visto como uma falta de internalização do problema, ou colocando a corrupção não como um “desejo visceral” do brasileiro em combatê-la, o que pode explicar sua ausência das reuniões de protestos organizadas nas rede sociais. Esta reflexão é justamente para chamar atenção que parece não existir uma vinculação entre a opinião expressada on-line com o desejo internalizado pelo indivíduo para agir. Talvez ao repercutir uma opinião na internet o indivíduo o faça mais por motivação social, para ser visto pelos demais como favorável a uma justa causa, do que efetivamente disposto a agir com sua presença em prol de tal causa/propósito. Assim, compartir, curtir, comentar, transforma-se em uma mera e superficial vitrine social.
Enquanto não internalizarmos de forma real o nosso repúdio à violência, contra a corrupção, contra a falência da saúde e a educação na rede pública, em manifestações que alcancem as ruas, de nada adianta “curtir”, “compartilhar”, retransmitir powerpoint e fotos por e-mail. Vale a pena lembrar que durante as diretas já, e mesmo mais recentemente durante o impeachment de Collor de Melo, os brasileiros foram as ruas quando não havia essas redes sociais na internet, nem tanta gente repercutindo e falando a respeito dessas mazelas políticas/sociais com tanta eloquência e entusiasmo. Pena que esse voluntarismo não vá para o mundo real, ficando com mero discurso vazio, agindo como um efeito placebo: Não cura, mas dá a sensação psicológica de alívio. Ledo engano!
João Lago
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont
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