Muitos dos complexos e das síndromes são inspirados na mitologia grega como o complexo de Édipo e a síndrome de Cassandra. Porém, existe um distúrbio em especial que não vem de uma alegoria, mas de um fato histórico. É justamente sobre o complexo de Heróstrato, ainda não tão conhecido, que esta resenha abordará.
Na Grécia antiga, uma das setes maravilhas do mundo antigo era o Templo de Ártemis, deusa grega da caça e da vida selvagem. Foi o poeta e escritor grego Antípatro que no século 2 a. C. fez a famosa lista que também incluía as pirâmides do Egito, as muralhas da China e outras cinco que já não existem mais. Antípatro descreveu o templo de Ártemis como uma edificação maravilhosa, possuindo cento e vinte e sete colunas em mármore com vinte metros de altura cada uma. Em seu interior uma estátua grandiosa em ébano da deusa Ártemis, com teto de madeira e inúmeras esculturas ornando o local. Assim, de tão belo o templo a deusa grega da caça era uma atração turística que encantava viajantes na antiguidade, até que um delinquente narcisista, chamado Heróstrato, resolveu colocar fogo na edificação com o objetivo de tornar-se famoso e ser lembrado pelos séculos como o homem que destruiu uma maravilha arquitetônica. Aliás, o narcisismo é um outro distúrbio psicológico também inspirado na mitologia grega que retrata alguém que ama tanto a si próprio que frequentemente cultua um exibicionismo excessivo.
Heróstrato não somente foi condenado à morte, mas também sentenciado ao esquecimento com a proibição da menção de seu nome. Os juízes que o condenaram temiam que outros surgissem com igual objetivo, mas Heróstrato não pode deixar de ser citado pelo historiador Teopompo e tanto entrou nos anais da história como um demente narcisista, quanto inspirou a psicanálise a nomear uma síndrome que leva o seu nome e que descreve indivíduos que cometem atrocidades com o objetivo de ser lembrados na posteridade. Entretanto, Heróstrato não está só nessa imensa lista de seres abjetos que cometem barbaridades e em um breve exercício de lembrança surgem nomes como Nero, Calígula, Vlad III (o empalador), Hitler, Jim Jones, Charles Manson, Osama Bin Laden entre tantos outros que ainda habitam este chão e que estão nas cadeias mundo afora. É certo que nem todos tinham a mesma motivação de Heróstrato quando cometeram seus crimes, apesar que cada um será lembrado por suas atrocidades.
O Brasil já algum tempo vem sofrendo carência de bons exemplos, ou seja, hoje não existem unanimidades na política, artes, ciências, esportes e negócios que possam ser citados como sinônimos de honestidade, inteligência, bondade, humildade, responsabilidade, coragem ou qualquer outra virtude que os identifiquem. Infelizmente, aparentemente a maioria dos ícones que abarcam duas ou mais virtudes citadas já estejam mortos e não sei se a taxa de reposição de pessoas boas é tão baixa que os indivíduos torpes vem ocupando todos os espaços possíveis. A pergunta que deve ser feita é onde foram parar os homens de bem? Talvez devêssemos resgatar a lanterna de Diógenes e buscar entre nós indivíduos que fossem indiferentes ao luxo, conforto e de todas as exterioridades que corrompem a integridade humana. No entanto, vivemos em uma sociedade que cultua o hedonismo, em uma urgente necessidade de satisfação dos prazeres, ainda que isto signifique cometer ilícitos, ou mesmo passar por cima de direitos de terceiros. Neste sentido, as redes sociais servem com vitrine para toda a espécie de ignomínia, desde bandidos exibindo vidas luxuosas a partir dos ganhos de seus crimes, ou mesmo indivíduos (conhecidos ou anônimos) usando a internet para expor homofobia, racismo, xenofobia, misoginia e toda sorte de desvio ético e moral.
A conclusão que podemos chegar é que o cansaço com o “politicamente correto” produziu na população uma tolerância em relação aqueles que se opõem a qualquer princípio civilizatório básico, inclusive permitindo que uma minoria torpe saísse das sombras e passasse a orgulhar-se de suas infâmias. Lamentavelmente, muitos desses indivíduos estão ocupando postos chaves na administração pública e boa parte da pauta nacional está deslocada para combater suas iniquidades enquanto que a vida dos brasileiros estão sendo afetadas com inflação, desemprego e fome.
Herotrástos estão no meio de nós e por não terem nada de bom a oferecer desejam simplesmente destruir tudo o que encontram pela frente. Deixam em ruínas um país e colocam o seu nome no panteão do abjeto sob o olhar passivo dos brasileiros de bem que absurdamente parecem ter abdicado do protagonismo. Talvez, contrário ao que se possa pensar, os bons sejam minoria e insistimos em acreditar que possam ser muitos, mas ainda existe a esperança que apenas estejam adormecidos a espera da chama de Diógenes. Não nos custa nada tentar acendê-la.
João Lago
Muito bom, parabéns amigo!
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