Em
um texto que escrevi em maio de 2014, teci comentários a respeito da
diferença do sentimento de pertencimento entre um homem e uma mulher
em relação aos seus filhos. Dizia que enquanto o sentimento de mãe
é forjado em suas entranhas, o homem demora um pouco mais para
sentir-se pai, fato que somente ocorrerá com o filho materializado
em seus braços. Falava do amor de mãe em tese, assim como em tese
discorro boa parte das reflexões que escrevo, tentando afastar-me do
objeto para construir um pensamento isento. No entanto, como poderia
escrever sobre uma personagem tão importante na formação de nossa
personalidade, seja intrinsecamente herdada, ou mesmo adquirida nos
exemplos, e não misturar com a minha própria experiência de também
ser pai?
Fui
um pai jovem, quando aos vinte quatro anos, nove meses e vinte quatro
dias encontrava-me no centro cirúrgico vendo o meu primeiro filho
nascer. Segurava uma câmera VHS (que os mais de quarenta anos
saberão o que é isto) encolhendo-me no canto da sala e sabendo que
se por um caso eu desmaiasse não receberia auxílio, pois afinal
naquele momento nem coadjuvante eu era. Um pai na hora do nascimento
de seu filho é simplesmente torcida. Porém, além deste momento
inesquecível, tenho muitas outras lembranças da infância de meus
três filhos, mas três são significativas.
Em
1992, por motivo de trabalho fui transferido para Brasília antes que
meu filho fizesse um ano de vida, ficando mais de um mês ausente de
casa. Assim, quando retornei para buscar minha família em Manaus,
depois dessa longa ausência, lembro-me que peguei meu filho no colo
e dali ele não quis mais sair, mesmo quando a mãe estendeu-lhe os
braços, como se para ele corresse o risco de ausentar-me novamente
por tanto tempo. Posso dizer que me senti gratificado, porque naquele
momento recebi uma retribuição do amor que tanto devotava por
aquela pequena criatura.
Anos
mais tarde, aproximadamente sete anos, meu segundo filho estava
começando a balbuciar as primeiras palavras, ficando a expectativa
se entre as sílabas pronunciadas sairia papai ou mamãe. Para nossa
surpresa, ele não somente resolveu dizer papai, mas a cada tentativa
de fazê-lo dizer mamãe ele retribuía dizendo “papai, papai”,
fazendo rir todos a sua volta. Porém, enquanto que a primeira
recordação de Lucas em meu colo apenas reside na minha memória,
essa segunda de João Alfredo tenho gravada em áudio.
Quando
fui pai pela terceira vez, durante o anúncio de uma nova gravidez,
eu sinceramente pensei que fosse outro menino, porque parece que
estava fadado a ser pai de meninos. No entanto, face a minha
preocupação presente com a saúde de todos eles, além de
acompanhar todas as idas ao pediatra, também fazia questão de estar
presente no pré-natal. Lembro-me que por volta de dezesseis semanas,
durante uma das ultrassonografias de acompanhamento, a médica
perguntou se gostaríamos de saber se era menino ou menina.
Logicamente saber o sexo do bebê facilita toda uma programação
logística e dissemos que sim. Não demorou muito, para termos a
certeza que era uma menina, pela posição que Lívia se encontrava
que facilitou a identificação. Foi uma alegria muito intensa para
mim e também um desafio, porque antes estava em uma situação
confortável de ser pai de meninos, mas apreensivo em saber se me
sairia bem como pai de uma menina. Porém, posso assegurar que foi
paixão a primeira vista e antes que se possa dizer que pai e mãe
sempre tem preferência por um filho em especial, na verdade o que há
é uma preocupação seletiva por um deles, que pode ser por aquele
que apresenta uma maior fragilidade frente ao mundo. Naturalmente,
nesse mundo tão hostil em que a força bruta sobressai, ser mulher
pode ser uma desvantagem e de alguma forma procurei dar uma maior
atenção a ela.
Sou
pai de três filhos, fugindo um pouco da ditadura dos dois, na qual
um é pouco e três é demais. Isso em uma sociedade que prega o
egoísmo que provoca ausências. Mas, posso dizer que durante toda a
infância e adolescência deles, a não ser por breves momentos,
impus a minha presença, o que foi importante para fazer-me mais
humano e mais preocupado com o futuro de meu país. Até pode ser um
senso comum, ou um aforismo dizer que construir um mundo melhor tem o
intuito de deixá-lo de herança para os nossos filhos, mas na
verdade ter essa preocupação é uma demonstração de amor. Um amor
que deriva do instinto de proteção que temos por nossa família e
que reflete em tudo o que está em nossa volta.
Os
filhos crescem, escolhem os seus caminhos, mas ficam as lembranças
da ternura que é ser pai. Contudo, nem todo homem pode se sentir
vocacionado a ser pai e, por isso, a responsabilidade de colocar um
filho no mundo não pode recair somente nos ombros de uma mulher. Eu
acredito que toda a criança merece um pai presente e que toda a
união entre um homem e uma mulher, que não for no intuito de formar
uma família, seja de responsabilidade de ambos evitar uma gravidez
indesejada. Escrevo isto porque esta sociedade egoista discute
novamente a legalização do aborto no Brasil, voltando a discutir o
que pode ser considerado vida, como se o feto no ventre de uma mulher
fosse um amontoado de células a se reproduzir como um câncer. O que
mais assustador, é que na cabeça de algumas feministas, o pai está
isento do direito da paternidade, pois mesmo que deseje ver o seu
filho nascer, ela se posiciona no direito de “extirpar o câncer”
dizendo: “meu corpo, minhas regras”. Boa parte da asseveração
desse pensamento reside no fato da indiferença e ausência da
responsabilidade masculina na hora de deitar-se com uma mulher.
Concluo
dizendo que ser pai é uma experiência fantástica, mesmo que
inicialmente possa parecer um pouco assustadora. Pois nada,
absolutamente nada, pode ser tão gratificante quanto a retribuição
do amor de uma criança.
Feliz semana e dia dos pais.
João
Lago.
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