Esta é uma resenha que não
gostaria de escrever, pois no mundo que idealizo a violência é um recurso que
só acontece na observância de três fatores: 1º) A inexistência (ou
impossibilidade) do diálogo e conciliação; 2º) O desequilíbrio das relações com
o empoderamento de uma parte em detrimento da outra e; 3º) A completa
desesperança na existência de uma segunda via que não seja a violência. Assim,
por mais enfadonho que possa parecer, desenvolver este raciocínio não pode ser
feito em poucas palavras, pois envolve uma análise de uma revolução silenciosa
que não terá reflexos imediatos, mas que no longo prazo pode acirrar ainda mais
a violência e propagar injustiças.
Nesta semana que se comemora o
dia oito de março, dia internacional da mulher, chegou-me a notícia que uma
amiga e ex-colega de trabalho em Brasília foi assassinada pelo marido a tiros e
esse logo em seguida também tirou a própria vida. Segundo relato da mãe da
vítima publicado na imprensa, o marido tinha brigas com a esposa motivadas por
ciúmes e o casal estava em processo de separação. Dessa tragédia duas crianças
ainda pequenas vão crescer sem os pais e a família terá a incumbência de
atenuar em suas vidas a razão terrível pela qual ambas ficaram órfãs. Este
caso, assim como outros, indica que uma mente perturbada pode praticar um crime
e não é a existência de uma lei que irá impedi-lo de executá-lo. Aliás, o crime
somente é caracterizado a partir da transgressão da lei, e a lei ocorre não de forma
profilática, mas como um remédio a doença social instalada. Neste ponto, a lei é
uma espada que pesa sobre o indivíduo transgressor do pacto social idealizado
por Thomas Hobbes e serve para definir os limites do homem natural, ou seja,
aquele que em sua natureza é mau. E é essa natureza má que leva o homem a
transgredir e não é a existência da punição que irá frear este instinto, pois
se assim fosse, ninguém beberia antes de dirigir ou deixaria de tirar a vida de
quem por amor deveria proteger. A lei Maria da Penha sob minha análise é uma
dessas leis inócuas para a profilaxia da violência que mata mulheres, pois infelizmente
ela não colocará um policial armado 24h vigiando a mulher e a mente doentia,
corroída pelos ciúmes e pelo sentimento de posse encontrará alguma forma de
despejar seu desespero.
Lembro-me que em meados dos anos
80 o lema que existiu nas primeiras reações ao crime passional era “quem ama
não mata” e desde então a sociedade falhou em criar medidas profiláticas aos
crimes passionais, que não deixaram de existir, tão pouco diminuíram a partir
da Lei Maria da Penha. Pelo contrário, segundo as recentes estatísticas a
violência tem aumentado. Engraçado é que a existência de delegacias
especializadas para violência contra a mulher foi justificada no fato que os
homens não estariam atentos a ouvir as ocorrências de violência contra as mulheres
e, portanto, era necessário que mulheres delegadas fossem designadas para tal.
Também, nas varas especializadas de violência doméstica e familiar contra a
mulher estão sendo nomeadas juízas, pois essas seriam mais capazes de entender
e julgar a violência pela qual sofrem as mulheres. Isto posto, o simples fato
de ser homem já nos colocaria como culpados em nossa natureza má tão alardeada
por Hobbes? Se homens são parciais quando se trata de violência contra a
mulher, o que impede que mulheres também o sejam? Não obstante, eu conheço um
caso de um cidadão que viveu décadas com uma mulher e que depois do final do
relacionamento e o mesmo vivendo em outra cidade, a mulher, motivada pela
disputa patrimonial, seis meses após separados fisicamente foi até uma
delegacia especializada e denunciou o marido por agressão sem apresentar
nenhuma prova da violência, ou qualquer registro posterior que o enquadrasse
como um homem agressivo. Foi somente a palavra dela contra a do marido, mas
mesmo assim a mulher obteve as medidas protetivas e as usa como forma de
intimidação. O que é bastante grave, haja vista que nesta semana o plenário do
Senado concluiu a votação de um texto que estabelece pena de detenção de três
meses a dois anos para agressores que desobedecerem medidas protetivas
previstas na Lei Maria da Penha. Como o texto já havia sido aprovado na câmara
dos deputados, o projeto de lei vai agora à sanção presidencial. O problema são
as distorções que a lei pode proporcionar no final das relações conjugais
quando a mulher valendo-se da presunção de culpa do homem use o aparelho repressor
do Estado para vingança pessoal ou qualquer outro sentimento mesquinho. O
problema da Lei Maria da Penha é que uma mulher pode avançar em um homem,
bater-lhe na cara e o mesmo não terá o benefício dessa lei, o que a faz uma lei
parcial. No entanto, por analogia homens podem até pedir medidas protetivas,
mas vai depender se o juiz (ou juíza) da causa ratificar ao homem o benefício
da lei, já que a mesma não se dá de forma compulsória como é o caso quando se
trata de mulher.
Outro ponto de inflexão da lei
Maria da Penha é que não permite o diálogo e a conciliação, porque da forma
como está posta uma mulher pode estar em um relacionamento abusivo, mas se
denunciar o companheiro deve estar convicta que será o final da relação, pois
sequer pode demonstrar arrependimento e retirar a queixa na delegacia. Portanto,
a mulher no desejo de continuar no relacionamento pode até levá-lo para um
desfecho trágico sem registrar uma única violência sofrida. Assim, a lei não
serve para a proteção e manutenção da relação conjugal, mas sim para sua
extinção e isto muitas vezes isto não é o desejo da mulher. O mundo ideal é o
qual o casal tivesse na lei um mecanismo alternativo que buscasse resgatar a
união e tratar a relação abusiva que afeta ambos, pois não será sempre o homem
o único algoz da relação. Ideal seria que a lei disponibilizasse apoio
psicológico e grupos de apoio para casais que desejassem superar seus
problemas, mas isto não acontece. Como exemplo, algumas religiões não toleram
relacionamentos abusivos e oferecem apoio aos casais para que se respeitem por
meio de terapias e, principalmente, reforçando valores morais que dão suporte
ao casamento: fidelidade, amor, solidariedade e respeito ao papel de cada um na
família. Aliás, a Campanha da Fraternidade da Igreja Católica neste período de
quaresma aborda a violência de modo amplo, inclusive a familiar porque a raiz
de toda violência reside no fato de não se amar o próximo como a si mesmo.
O terceiro ponto que abordo nesta
resenha é a desesperança, ou seja, aquele indivíduo que pela ausência de amor a
si próprio e capaz de matar e tirar a própria vida em seguida. Ou mesmo aquele
que mata destruindo sua vida para qualquer perspectiva futura, pois é certo que
a sociedade não mais tolera o crime passional e o destino de quem o pratica é
ser hóspede do sistema carcerário durante um bom tempo. Hoje o meu sentimento é
que gostaria de ter oportunidade de conversar com cada homem que se sente justo
(ou injustamente) vítima de vilipêndio em uma relação amorosa para dizer-lhe
que o sol nascerá no dia seguinte e que todo o sofrimento um dia termina. O
tempo sara todas as feridas e o destino talvez reserve um novo amor, uma nova
família, um novo lar, um novo caminho cujas únicas bagagens que devam ser
carregadas são as boas lembranças que ficaram para trás e que balanço dos erros
cometidos seja necessário para não serem reproduzidos novamente. Não se merece
ser infeliz duas vezes pelos mesmos motivos.
Um dia penso encontrar pessoas
que possam formar grupos de apoio para ajudar outros homens a sair de
relacionamentos abusivos, principalmente aqueles que não têm apoio de amigos, não
possam contar com a família, tão pouco tenha uma fé para lhes trazer esperança.
Alertar a sociedade que a lei Maria da Penha, longe de ser uma solução que
traga paz na família, serve da forma que está sendo aplicada para acirrar ainda
mais a violência e ser motivo de criminalização compulsória do macho na
relação. Afinal, nem todo comportamento de macho é machismo e nem o machismo é comportamento
de homem. Comportamento de homem é o cavalheirismo.
Termino reproduzindo uma frase
que li na publicação de uma mulher que na rede social lamentou o assassinato dessa
minha amiga com a seguinte frase: “Quem deveria proteger, desprotege e pratica
uma insanidade dessas”. É justamente isto! O instinto nato do homem deverá ser
sempre o de proteção à mulher e muitas vezes proteger significa deixar ir,
esquecer as mágoas, perdoar e seguir em frente.
João Lago.