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terça-feira, 24 de junho de 2014

Nosso sorriso, nosso maior patrimônio



Essas semanas de jogos do mundial de países aqui em Manaus, inicialmente tinha tudo para ser um evento para mim restrito a quatro partidas de futebol, pois havia conseguido comprar ingressos para todos os jogos. No entanto, tudo se modificou a partir de uma ligação telefônica de um amigo, que hoje trabalha e mora no Panamá, para ajudá-lo a organizar a recepção de um grupo de 50 colegas de trabalho da América Central. Assim, de certa forma tornei-me de ultima hora anfitrião, pois caberia a mim indicar os melhores passeios, os melhores restaurantes e ter a grande responsabilidade de mostrar a hospitalidade manauara que está tão em destaque na imprensa nacional (quiçá internacional).

Em um passado bem distante, lá pelos meus 17 anos, trabalhei como guia “freelancer” da extinta agência Selvatur do também finado Hotel Amazonas, quando em passeios de barco pelo lago do Janauari,  apresentando as belezas naturais de nossa floresta, aprendi que o banal aos nossos olhos acostumados com a exuberância do “inferno verde” tem o valor de uma experiência única para o estrangeiro urbano. Porém, nesse grupo que veio para Manaus estavam mexicanos, panamenhos, peruanos, colombianos, equatorianos que detém também em seus territórios uma exuberância significativa de floresta, principalmente Equador, Peru e Colômbia que abarcam parte da Amazônia sul-americana. E mesmo para os países da América Central cabia a dúvida: “¿ La humedad del aire en Manaus es mas grande que en Panamá?”. Ora, excetuando as localidades andinas, o clima de Manaus muito se assemelha em paisagem e calor com muitas cidades dos países citados.

Nossas belezas naturais fascinam, pois um rio caudaloso que nem o nosso Amazonas não se encontra em qualquer lugar, muito menos o fenômeno hidrológico do encontro das águas do Rio Negro com as águas barrentas do Rio Solimões, dando a impressão que estão apartadas fisicamente, repelindo-se entre si por quilômetros de extensão. Temos também nossa fauna: o boto, o peixe-boi, a ariranha, a anta, a onça e uma culinária rica a base de pescado proveniente de uma cultura indígena-cabocla original. Ainda guardo comigo a expressão de espanto dos visitantes frente a um tambaqui de 30 quilos, uma raridade até mesmo para os meus olhos, mas que foi devidamente congelada pelo dono do restaurante regional, como se tamanha opulência não merecesse ir para a panela.

A beleza arquitetônica de nossos monumentos históricos tem similares em outros lugares do mundo. Portanto, apesar de belos, hão de ser comparados com tantos outros erguidos pela mão do homem em outros sítios. Decididamente não será isto que irá fascinar nossos visitantes e não é disto que está falando a imprensa internacional. A cereja do bolo é nossa cordialidade, muitas vezes ingênua, de abrir nossas portas para o que vem de fora e o que nos faz um povo generoso. Já vivi em outras praças e posso garantir que isto talvez tenha similaridade somente no Nordeste brasileiro, mas conforme avançamos para o sul, isto vai se perdendo. Quando morei em São Paulo e Minas Gerais aprendi que é de “boa educação” ligar para o amigo antes de ir visitá-lo em sua casa, coisa que jamais cogitei em minha juventude manauara. Dizia simplesmente: vamos à casa do fulano, obviamente assumindo o risco de não encontrá-lo, mas isto era um mero detalhe. Assim, dessas experiências do jeito manauara de ser, recordo-me de um dia 31 de dezembro no qual resolvo visitar meu amigo Marcelo e encontro sua esposa grávida em pleno trabalho de parto, literalmente correndo da sala para cozinha. Em face da urgência, acabei por participar de forma decisiva da vinda ao mundo de Joaquim, que tenho um profundo amor como se de meu próprio sangue fosse. Talvez se tivesse ligado antes a formalidade teria nos apartado deste momento mágico.

Tambaqui, peixe amazônico
O manauara genuíno gosta de gente e se satisfaz em servir descompromissadamente, que faz desta terra um lugar tão aprazível ao forasteiro e, não por acaso, no senado do Amazonas não tem um amazonense sequer. Porém, nesse caso, talvez resida a maior de nossas ingenuidades, mas isto é uma outra história.

Estamos sempre de braços abertos, pois se faltou a infraestrutura prometida para a Copa do Mundo em Manaus, aqui jamais faltará um sorriso e uma mão amiga estendida.

João Lago.
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Compro um par de óculos ou uma geladeira?



Manaus, 29.4.2013

Em 2002, quando morava em Belo Horizonte, a assembleia legislativa mineira criou
a CPI do leite, tentando descobrir o que encarecia tanto o leite UHT (leite longa vida ou de caixa), haja vista que o produtor rural recebia apenas R$ 0,22, enquanto que na gondola do supermercado o preço era de R$ 1,50, ou seja, do produtor até o consumidor havia um acréscimo de quase 600%. Acompanhei todo esse problema de perto, pois na época trabalhava para uma multinacional que produzia leite longa vida.

Leite é um elemento básico da alimentação, portanto não se trata de artigo de luxo, então mais do que necessário o esclarecimento público no que se refere a indícios de cartelização do setor. Alimentação e saúde encabeçam as necessidades básicas de qualquer indivíduo, portanto mais do que justo  o esclarecimento de como se formam preços, principalmente quando surgem algumas dúvidas sobre eventuais abusos por parte de setores do comércio e da indústria para com a economia popular. Neste caso, quero me referir aqui diretamente ao comércio de armações e lentes de óculos em lojas especializadas.

Abro o jornal e dele retiro um encarte que oferece uma geladeira ao preço de R$ 869,00, basicamente o preço que é oferecido por um par de óculos em qualquer uma dessas redes de óticas de Manaus. No mesmo encarte, encontro um celular de marca famosa, que aceita dois chips pelo preço de R$ 229,00, que sinceramente quase não se encontra um par de óculos que seja razoável neste valor. O mais interessante é quando entramos em uma loja dessas, eles facilitam o pagamento em parcelas a perder de vista, querendo passar a impressão que é uma pechincha. Tem até uma ótica no centro da cidade que montou um bar dentro da loja, que serve bebidas variadas (uísque, refrigerante, vinho etc.) para oferecer ao cliente. Até pode ser uma boa estratégia, entorpecer a mente do pobre coitado para que ele não perceba o quanto que é absurdo o preço praticado em um artigo que não é de luxo, mas de necessidade.

Se você usa óculos e pagou mais de R$ 700,00 por uma “boa armação” (perdoe-me o trocadilho), pense em uma geladeira, ou mesmo em um celular e perceba quanta tecnologia está agregada ao produto. Quanto material utilizado, ou mesmo o quão é extensa a cadeia produtiva para que o mesmo seja oferecido ao preço que é encontrado na loja. Ora, uma geladeira pesa e é volumosa, portanto dever ter uma logística que agregue um custo de armazenamento, movimentação e transporte da fábrica até as lojas, o mesmo pode se dizer dos celulares, mas um par de óculos, que peso tem? Que espaço ocupa?

Em maio de 2011 as polícias do Paraná e de Minas Gerais desmantelaram uma quadrilha que contrabandeavam armações chinesas pagando centavos de dólar e, após os produtos serem “esquentados”, eram vendidos no comércio de Curitiba e Belo Horizonte a preço semelhantes aos praticados aqui em Manaus. Nesse esquema, que envolvia várias empresas de fachada, foi preso inclusive um ex-deputado federal por Minas Gerais, Francisco Sales Dias Horta, além de grandes empresários donos de redes de óticas nos dois estados.

Logicamente que um esquema fraudulento que compra por centavos e vende a preço de ouro, quando “esquentado” por notas ficais de entradas falsas, gera uma dinheirama que precisa ser justificada, ou melhor dizendo, esse dinheiro todo tem que ser “lavado”. Se alguém viesse me perguntar qual a melhor maneira de “lavar dinheiro”, eu provavelmente poderia sugerir algum tipo de comércio, provavelmente ligado a serviços, como por exemplo: Produzir Show e Eventos, cuja receita é gerada em bilheteria. Ora, tanta gente compra ingressos de show e não vai, não é mesmo? Ou ainda, quem pode aferir se realmente determinado show ou evento gerou tal quantidade de receita que diz que arrecadou? Não tenho experiência no ramo, mas acho que talvez o ECAD, quando a negociação sobre os direitos autorias implique o envio de fiscais no dia do evento, caso contrário, acredito que não.

Não por acaso, vejo óticas patrocinado (ou será produzindo?), tantos shows aqui em Manaus, que me deixa com meus nervos a flor da pele, pois o meu par de óculos está bem velhinho, já descascando a armação, precisando eu de óculos novos, mas parece que a minha miopia é menor do que aquela que acomete o meu povo que não enxerga que há algo de errado no preço de lentes e armações que são oferecidos em nossa cidade.

Situação pior é quando se vai a uma dessas óticas acompanhados de filhos adolescentes, pois neste caso meu amigo, face a exigência estética que eles nos impõem, acho que R$ 700,00 vai parecer uma verdadeira bagatela. Provavelmente vais pagar em uma armação e lentes o preço de uma TV de  LED – Full HD de 32 polegadas no mínimo.

João Lago.
Administrador, professor e morador do Conjunto Santos Dumont